quinta-feira, 12 de agosto de 2010

CISMA NA IGREJA DE FAFE


Tive a honra de integrar o painel que fez, na noite de quarta-feira, 11 de Agosto, a apresentação pública do livro Cisma na Igreja de Fafe, da jornalista Joana Carneiro, num cenário belamente arquitectado.
Fi-lo, com toda a consciência e com todo o gosto, não porque me diga já muito a polémica que se gerou em torno da expulsão do Padre Lopes, que continuo a não entender, que não está minimamente explicada e sobre a qual tomei a posição que está num dos posts deste blogue, mas, sobretudo e basicamente, pela antiga amizade, e pela muita estima, respeito e consideração que me ligam ao Padre Peixoto Lopes. Um Homem de Bem. Um Homem Bom, que foi desqualificado pela hierarquia, empobrecendo fortemente a Igreja que, quer queiramos quer não, faz parte da cultura e da identidade de um povo. E é uma exigência ética e humana estar ao lado dos amigos, sobretudo nos maus momentos. Ou então não somos amigos!...
Não concordo com as posições de sobranceria intelectual daqueles que consideram que estas manifestações de Fafe são apenas de arruaceiros ou de gente menor, que denigrem a imagem da cidade. Esta é também a nossa gente e as posições compreendem-se a uma determinada luz, concorde-se ou não com os seus fundamentos. É claro que não identificam Fafe, nem as suas gentes, antes simbolizam um determinado momento e um grupo da sua população. Há que assumi-los, contudo. Os povos não têm apenas histórias brilhantes e luminosas; e não é por isso que se apagam momentos e actos menos felizes.
Quanto ao livro, foi escrito em tempo recorde, a partir do conhecimento do caso de Fafe, portanto com todos os riscos que tal comporta (o de inscrever alguns lapsos e gafes, como acontece). No entanto, é um trabalho jornalístico bem estruturado, objectivo, sério, estribado numa linguagem escorreita, acessível ao comum dos leitores.
Gostaria de destacar, desde logo, o excelente prefácio do António Marinho Matos, o editor, sob o título “A sociedade aberta, a modernidade líquida e a ética da hospitalidade” que, usando de algumas ideias de filósofos contemporâneos, como Karl Popper (A Sociedade Aberta e os seus Inimigos), Sygmund Bauman e Daniel Innerity (Le Philosophe de L’Invisible), enquadra na perfeição, a nível teórico, o que sucedeu nesta cidade, mostrando as várias leituras do problema.

Ao contrário da sociedade aberta

No fundamental, fica-se com a ideia de que a sociedade portuguesa em geral apresenta um grave défice de pensamento e que a Igreja espelha também esse défice de pensamento e de reflexão.
A Igreja é apresentada como o contrário da sociedade aberta, que se funda na possibilidade da crítica racional e livre e é também mostrada como um sistema organizacional que nada tem a ver com o sistema democrático, antes se construindo numa “ordem” carismática, autoritária, e decisiva do Mestre, “que não admite qualquer miragem de contra-ordem ou sequer a possibilidade de ligeira discussão”.
Belas páginas a ler com atenção.
O capítulo “Crónica de um cisma anunciado” relata a cronologia dos acontecimentos. A partir de meados de Julho, e do movimento eclesiástico na arquidiocese, decidido por D. Jorge Ortiga, em 18 de Julho de 2010, com a exclusão do Padre Lopes da paróquia de Fafe, todos conhecemos o que se passou e as reacções, mais ou menos apaixonadas, mais ou menos destemperadas, embora compreensíveis, dos fiéis da Igreja fafense. Inundaram a televisão e a imprensa.
Um outro momento de óbvio interesse na obra é a longa entrevista feita ao chamado “Padre do Povo de Fafe”, em que Peixoto Lopes se confessa imperfeito, por ser humano, em que aborda temas pertinentes e actualíssimos como as vocações, o celibato, a descristianização da sociedade, a abertura da Igreja ao mundo actual, os padres na política, a dicotomia homem/padre, a posição sobre o uso do preservativo, o aborto e a eutanásia, a ordenação das mulheres e o casamento homossexual.

Arcebispo de Braga: tolerância zero

Nesse interessante documento defende-se das acusações do arcebispo de Braga, censurando a sua fuga ao diálogo, a falta de coragem de falar com o pároco cara a cara, a sua “decisão injusta, cruel, inoportuna” e até ingrata, por tudo quanto o Padre Lopes fez durante o seu ministério de 25 anos pelo crescimento temporal e espiritual da paróquia.
E foi muito, como todos sabemos, e o livro relembra, que motivou a recente e unânime decisão do Município de atribuir ao pároco que abandona o seu magistério em Setembro a Medalha de Ouro de Mérito Concelhio.
Enfim, um livro que diz da injustiça, dos atropelos, da arbitrariedade, do autoritarismo, do exercício do “quero, posso e mando” (tão na lógica do ordenamento religioso…) que se abateu sobre o Padre Lopes, cujo “crime” parece ter sido o de não ter mandado para Braga quanto dinheiro Braga queria que ele mandasse. Pelo menos, e até se saber outra razão, é o motivo que mais impera…
Uma obra com ilustrações que se folheia com agrado, abordando ainda brevemente o Padre José Manuel Faria, D. Jorge Ortiga, o padre João Fernando Araújo, que vem de S. Torcato, os textos controversos do blogue do padre Albano Nogueira, um texto do Papa João Paulo II sobre o código do direito canónico e, enfim, dois comentários de teólogos sobre esta ocorrência.
Deixem-me concluir com a citação do arcebispo de Braga (p. 16 do livro), quando afirmou a uma revista católica (Faz-te ao largo!), em Outubro de 2009, que a educação devia servir para sermos capazes de conviver com a diferença. (…) A tolerância é eu ser capaz de conviver com alguém que pensa de maneira diferente da minha.
Manifestamente, o arcebispo de Braga não foi tolerante neste caso de Fafe.

Uma justa medalha para o Padre Peixoto Lopes

A Câmara de Fafe deliberou há oito dias, por proposta do seu presidente e por unanimidade, atribuir a medalha de ouro de mérito concelhio ao Padre José Peixoto Lopes, a qual será entregue “em momento oportuno”.
A proposta tem como pretexto a celebração, este ano, dos 25 anos do exercício pastoral de Peixoto Lopes na paróquia de Fafe, “onde prestou relevantes serviços” à respectiva comunidade.
Concretamente, é referida a marca deixada pelo clérigo “em muita obra feita”, neste quarto de século, como são os casos das capelas mortuárias, das capelas da Granja e dos Fiéis de Deus, a aquisição da residência paroquial, a renovação do salão paroquial e da tipografia e a construção da nova Igreja do Sagrado Coração de Jesus, entre outros, “enriquecendo a Igreja, mas também, patrimonialmente, a nossa cidade”.
A Câmara considera ainda que o Padre Peixoto Lopes manteve, ao longo destes anos, uma atitude de grande cooperação e respeito, bem como de grande independência, relativamente aos órgãos autárquicos eleitos.
Por último, entendem todos os membros do Executivo “ser de justiça reconhecer os seus méritos e a sua acção, na hora em que cessa funções”.

2 comentários:

Anónimo disse...

Tudo podia ser evitado!
Urge que o Arcebispo e os seus padres cresçam numa pedagogia de fé verdadeira, autêntica e pura.É urgente a União em comunhão de Oração e de Esforços.
E como aprendi com os meus pais que quanto maior for o nosso conhecimento, maior será a nossa responsabilidade, por isso se houver alguma razão de queixa contra alguém, não ponhamos na "arena" as suas fraquezas, mas sirvamo-nos das Belíssimas Lições do Evangelho, do perdão,da Misericórdia de Deus e da Caridade.
Que o Espirito Santo a Todos Ilumine e nos faça Santos.
M.P.

SofiaC disse...

Este «editor» António Marinho Matos anda a burlar autores, revisores, paginadores, etc., há quinze anos. Eu fui uma das vítimas e fui à polícia depor a favor de outra vítima em 2001, mas, pelos vistos, nada. E pergunto-me como é que é possível que o burlão continue no activo. Que raio de polícia e sistema judicial temos nós?
É preciso burlar um jornalista para que o caso vá para a frente? Que tristeza.