O XIX governo constitucional tomou posse a semana passada, para um previsível horizonte temporal de quatro anos, se nada de extraordinário ocorrer entretanto. Como é evidente, nesta altura, não é possível nem avisado formular juízos de valor sobre as políticas que vão ser prosseguidas pelo novo executivo e que ninguém conhece, apesar de haver linhas de eventual actuação futura que não são de modo algum animadoras.
Para já, o que proliferam são os “sinais”, presumivelmente para servir de paradigma aos comportamentos de contenção e austeridade que os tempos actuais exigem. Este começa a ser o governo dos “sinais”.
O primeiro dos “sinais”: a exiguidade do novo governo (apenas 11 ministros, a que acresce o chefe do executivo) e a supressão e/ou concentração de algumas pastas. A primeira questão, a do modelo governamental, é uma supina concessão ao populismo e ao “politicamente correcto”. Afirma-se que um governo curto traduz um “sinal” de poupança, numa altura de aperto económico e de necessidade de combate ao défice. Desculpem, é uma opção simpática, mas que só por demagogia se pode sustentar: não são os ordenados de mais quatro ou cinco ministros que deitam a perder as contas públicas. Pelo contrário: não está provado que um governo com o tamanho de uma equipa de futebol seja mais eficaz, eficiente e obtenha melhor desempenho que um executivo mais equilibrado, mais próximo do que se passa na Europa.
Mais graves, a meu ver, são outras opções. Desde logo, a da concentração de ministérios. Eu não consigo perceber como é que a ministra Assunção Cristas, por exemplo, que considero simpática e dizem competente, pode abarcar adequadamente quatro pastas, que normalmente dão origem a dois ou três ministérios: agricultura, mar, ambiente e ordenamento do território. Só uma supermulher. Ou nem essa… Também não compreendo como é que o ministro da educação também o é do ensino superior e da ciência, áreas com lógicas absolutamente diferentes e não compagináveis. Como não entendo, inversamente, a despromoção da cultura a mera secretaria de estado. Ou até entendo: a direita tem da cultura uma visão meramente instrumental e decorativa, a começar pela sua dependência directa do primeiro-ministro. Nesta lógica distorcida, Guimarães nunca seria uma Capital Europeia da Cultura, nem em 2012 nem em 2020!...
Este o primeiro grande “sinal”, cujos resultados só o futuro ditará, embora, os especialistas, aqui chamados “politólogos”, determinem que “uma equipa pequena pode aumentar o risco de desgoverno”. Mas a política não é, nem nunca foi, uma ciência exacta!...
Depois, os pequenos “sinais”. Passos Coelho terá viajado em “classe económica” e acompanhado de uma pequena comitiva para o Conselho Europeu, a meio da semana Sempre para dar o exemplo. Aquilo que seria uma louvável notícia, neste acre tempo de crise, acaba por ser toldada pela informação de que, afinal, no espaço europeu, os governantes viajam quase sempre à borla. Lá se foi o “sinal”!...
Ainda um outro “sinal”, para findar esta crónica. Na cerimónia de tomada de posse, o novo primeiro-ministro anunciou, urbi et orbi, que não nomeará novos governadores civis, locais de colocação habitual de pessoal político-partidário que perde eleições autárquicas ou não “encaixa” em outros lugares mais compatíveis do aparelho de Estado. O pretexto, como sempre, será poupar, o que, novamente, se elogia.
Há, nesta aparente boa nova, dois ou três senões. O primeiro é o de que, afinal de contas, tudo vai continuar na mesmíssima, apenas desertando o pessoal político. O gabinete e o pessoal dos governos civis vão continuar, sob o comando dos secretários, figuras não nomeadas politicamente, por isso fragilizadas e que certamente apenas vão resolver situações de recurso. Em segundo lugar, a extinção dos governos civis, na verdade, aberrações e anacronismos que já não se justificam nos nossos dias, impõe uma alteração da Constituição, que os partidos da direita, em conjunto, não conseguirão ultrapassar. O Partido Socialista terá aí uma palavra a dizer!...
Finalmente, não se entende, como é que os partidos que execram a necessária regionalização, acabam com os governos civis sem cuidar de distribuir as suas tarefas por outros organismos e pelas autarquias, eventualmente, e sem contribuírem para a criação de um patamar de poder político, legitimado eleitoralmente, que faça a ponte entre o poder central e as autarquias locais, o que apenas as regiões administrativas poderão conseguir.
Quanto ao resto, neste organigrama governamental, fico à coca da nomeação de um gestor de empresas para o ministério da saúde, uma área que requer sensibilidade, humanismo e espírito social, que manifestamente não se antevêem. Paulo Macedo é a garantia de que a saúde vai ter de dar lucro, pelo desinvestimento no sector público, pela entrega do sistema à iniciativa privada. Os mais ricos vão ter à sua disposição os seguros e as clínicas, como até agora; os mais pobres vão ter o refugo do sistema, as sobras da saúde que não é possível de todo abdicar. O que é preocupante, num país de dois milhões de pobres e centenas de milhar de idosos e reformados de fracos recursos.
(Artigo publicado no jornal Correio do Minho, de 27 de Junho de 2011)
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