Com o título em epígrafe, foi publicado
pela Âncora Editora um interessante livro dos investigadores barrosões António
Chaves, Barroso da Fonte (distinto amigo e colaborador do jornal local Povo de Fafe), Bento da Cruz e
José Baptista.
A obra teve como pretexto a passagem do
centenário da segunda incursão monárquica (1912), a qual causou grande impacto
e repercussão nesta região, de Fafe a Vinhais, passando por Cabeceiras de
Basto, Chaves, Valença do Minho e Porto. Mas também os 150 anos sobre o
nascimento do que viria a tornar-se o “Padre Guerrilheiro”, em plena I
República, o Padre Domingos Pereira, um dos mais destacados promotores da
contra-revolução monárquica nesta zona, que viu a luz do dia em Vilarinho de Negrões
(Montalegre), em 9 de Agosto de 1862.
Ordenou-se sacerdote, aos 24 anos, em 1886
e foi colocado na paróquia de Outeiro, em Cabeceiras de Basto, por influência
familiar, sobretudo de seu tio, Padre João Albino Carreira, pároco de Refojos. “Cedo
o atormentou a verruma da política que então era mesmo política activa e
fervorosa mesmo entre o clero” (José Baptista). Filiou-se então no Partido
Regenerador, cuja paternidade ideológica se deve a Alexandre Herculano e do
qual fizeram parte o Marechal Saldanha e Fontes Pereira de Melo, entre outros.
Próximo de 1900, milita activamente no
Partido Regenerador e entra com afinco na campanha eleitoral desse ano. É
chamado ao Paço Arquiepiscopal de Braga, onde o arcebispo, D. Manuel Baptista
da Cunha, o incita a aderir ao Partido Progressista, sob a ameaça de perder a
sua situação privilegiada. O prelado advertiu-o de que, em caso de recusa,
seria transferido para uma paróquia sertaneja.
O Padre Domingos Pereira não aceitou a
imposição, que ia contra a sua liberdade e integridade de carácter.
De imediato devolveu o mandato da paróquia
de Outeiro, retirou o cabeção e a sotaina e abandonou o magistério sacerdotal,
após apenas 13 anos de pároco.
Regressou a Cabeceiras, trocando o
sacerdócio pela política local, “onde alcançou grandes vitórias em todo o
distrito bracarense a favor dos regeneradores”. E foi nesta linha que, sempre
que os regeneradores ganhavam as eleições, Domingos Pereira era nomeado
administrador concelhio. Por isso, chegou a ser administrador em Fafe e em
Cabeceiras de Basto, pelo Partido Regenerador, o mesmo de Paiva Couceiro, em
cujas hostes acabaria por tornar-se guerrilheiro.
Sem outros meios de subsistência, passou a
dedicar-se ao ensino, como professor de História, Geografia, Português e Latim,
no liceu de Cabeceiras, o que acabou em 1908. O Padre Domingos Pereira (que
manteve a designação de “Padre” por toda a vida, apesar de nunca mais ter
exercido o sacerdócio) passou por algumas dificuldades, mas manteve o seu
“mandato monárquico”, incitando vizinhos e amigos a manterem-se fiéis a Deus, à
Pátria e ao Rei.
Após o 5 de Outubro de 1910 e a instauração
da República, o Padre Domingos Pereira toma o “partido” da resistência
monárquica ao novo regime, enfileirando nas hostes de Paiva Couceiro, que foi
praticamente o último e único monárquico a combater os republicanos, na
Rotunda.
Tornou-se, assim, um “agitador monárquico, com
forte implantação regional e de reputação nacional” (António Chaves).
Participou nas incursões monárquicas, sob a
inspiração de Paiva Couceiro, ao lado dos paladinos da “Monarquia e da Santa
Religião”. Aliás, o clero era o principal instigador da rebelião das
populações, na sequência das polémicas medidas decretadas pelo Governo
Provisório, e em especial por Afonso Costa, contra a Igreja e as ordens
religiosas.
Pela participação na rebelião apanhou duas
décadas de penitenciária, à revelia, mas nunca cumpriu, por se ter homiziado na
Galiza ou andar pela sua terra, clandestinamente.
Voltaria a participar na contra-revolução
monárquica de 1919, concretamente na “Monarquia do Norte” (19 de Janeiro/13 de
Fevereiro), popularmente conhecida por “Traulitânea”, dados os abusos cometidos
sobre os republicanos. Domingos Pereira servia de elemento de ligação entre os
combatentes no terreno e o chefe Paiva Couceiro, presidente da Junta
Governativa, que estava no Porto.
Frustrada a restauração monárquica no
norte, o Padre Domingos Pereira volta a exilar-se na Galiza (como Paiva
Couceiro e a generalidade dos conspiradores). Julgado à revelia no Tribunal
Militar do Porto, foi condenado a 20 anos de prisão maior, como tinha
acontecido sete anos antes.
Porém, embora condenado a 40 anos de cadeia,
pelas duas vezes em que participou na alteração da ordem republicana, o
conhecido “guerrilheiro” não cumpriu um único dia de prisão.
Conhecido como “cabecilha das incursões
monárquicas na zona de Basto” (Barroso da Fonte), Domingos Pereira teve mulher
e no mínimo seis filhos e passaria os últimos vinte anos da sua vida em maior
acalmia, embora com dificuldades materiais. Faleceria em 1945, com 83 anos de
idade.
José Baptista considera que “O Padre
Domingos foi homem de convicções e nobilitante dignidade pessoal”. Já o amigo
Barroso da Fonte refere que “A sua vida foi uma luta constante pela defesa das
suas ideias” e conclui o seu texto, “Domingos Pereira – Glória e Martírio de um
Padre Guerrilheiro”, com estas palavras: “A firmeza do seu carácter, a
frontalidade da sua conduta, a obstinação irrepreensível da sua teimosia, mesmo
correndo todos os perigos pessoais e familiares, podem merecer censuras. Mas
são essas algumas das virtudes que diferenciam os homens e conduzem à epopeia
da liberdade”.
Enfim, estamos em presença de uma excelente
biografia, em diversos tons, diria, a oito mãos, sobre um dos personagens mais
emblemáticos da guerrilha nesta região, na primeira década da I República.
(Povo de Fafe, 07 Dezembro 2012)
1 comentário:
É deveras INACREDITÁVEL como facilmente se elogia um trauliteiro assassino nos tempos que correm! Gente desta laia fascizante não é útil ao país nem à nobre região do Alto Trás-os-Montes! Tenham vergonha!
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