terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Um povo que não consegue sentir a mínima esperança!

 
1. Neste sábado, incontáveis milhares de portugueses saíram à rua, um pouco por todo o país, Braga incluído, para demonstrar a sua indignação, agastamento e revolta pelo rumo que a governação está a tomar.
Gritaram-se palavras de ordem contra um governo “que se ajoelha perante a tróica e inferniza a vida aos portugueses», como foi sublinhado, chegando o líder da Intersindical, Arménio Carlos, a acusar o executivo de estar a afundar o país e reafirmando o pedido para que “Passos Coelho se vá embora”.
O dirigente máximo da CGTP classificou a ofensiva governamental contra os portugueses de “ajuste de contas com Abril» e acabou por pedir que o Governo tenha a coragem de cortar com a «despesa inútil e parasitária», sugerindo um corte nos «8.000 mil milhões de juros pagos aos usuários que fazem negócio com a dívida soberana», um corte «nos milhões desperdiçados nas negociatas das Parcerias Público Privadas», um corte «nos chorudos benefícios fiscais aos grandes grupos económicos» ou aos «gestores que auferem salários multimilionários». Inteiramente de acordo. Haja moralidade!
2. Os portugueses têm inteiro direito de estarem indignados, revoltados, desiludidos com o estado a que as coisas chegaram. Estamos em presença de um governo que, sistematicamente, erra previsões, falha objectivos, não atinge os mínimos estabelecidos para as metas. Um governo que, estando a actuar ao contrário de tudo o que prometeu, pondo em causa a sua legitimidade política, sem qualquer dúvida, demonstra uma insensibilidade social atroz, chocante, tanto se lhe dando que haja um milhar como um milhão de desempregados, o que não é bem a mesma coisa.
As medidas que têm sido tomadas nos últimos tempos para enfrentar a crise têm gerado monstros de imensas cabeças. A paixão da austeridade tem somado mais desemprego, mais pobreza, mais dependência externa.
Soube-se nos últimos dias que a taxa de desemprego em Portugal deverá continuar a subir este ano, até atingir os 17%, número bem pior que o governo temia. Porque o governo pensa estancar o desemprego e as falências com o alentejano dinamismo de Gaspar, mas a doentia “receita” da tróica não pode dar outro resultado. Por isso, há que mudar urgentemente de política, como bem sublinhou este fim-de-semana António José Seguro, e que a sétima avaliação dos sanguessugas da tróica seja feita a nível de “políticos” e não de “técnicos”, cuja incompetência para conhecer, sentir e avaliar Portugal já está mais que demonstrada!...
Trocado por miúdos: mais de 923 mil pessoas estão oficialmente sem trabalho em Portugal. O que representa mais 20% relativamente ao ano anterior.
O caso dos jovens é o mais grave, com uma taxa de desemprego nos redondos 40%, no último trimestre de 2012. Estamos a falar de 164,9 mil pessoas entre os 15 e os 24 anos. Uma enormidade.
Outro dado relevante, prende-se com o número de pessoas sem trabalho com habilitações superiores: quase 150 mil. Diria: uma atrocidade, aqui ou em qualquer lugar do mundo!
3. Outro dado absolutamente aterrador: a taxa de risco de pobreza em Portugal atingiu os 18% em 2011, segundo revela o relatório «O impacto da crise europeia», da Cáritas Europa, conhecido na passada semana. Um número muito acima da média da União Europeia a 27. Significa que o risco de pobreza no nosso país atinge mais de 1,9 milhões de pessoas, que viram os seus rendimentos degradados nos últimos anos e não conseguem fazer face às exigências da sua vida diária, nos seus diversos sectores.
Essa inacreditável e indigna taxa de pobreza desdobra-se em números impressionantes: a pobreza infantil atinge os 29%, o que só pode envergonhar quem tem e teve responsabilidades políticas neste país e que não é nem foi capaz de estar à altura das suas exigências; a taxa de pobreza entre os idosos regista os 20%. É o resultado visível e imediato das férreas políticas de austeridade dos últimos anos e em especial no último ano e meio, em que foram destruídos postos de trabalhos como não há memória.
Além da destruição de empregos e do empobrecimento generalizado da população, os portugueses são os líderes europeus no pagamento de impostos. Só no IRS pagamos 10% mais que a média europeia. Nós que recebemos, genericamente, ao fim do mês, bem menos que a média dos europeus!
4. No meio desta pouca-vergonha, vem Pedro Passos Coelho, ao seu pior nível, como sempre, insultar os cidadãos, numa estratégia de insensibilidade aterradora: «Os portugueses podem estar confiantes de que o Governo não exigirá mais do que aquilo que é necessário para que se cumpram os objectivos, sem que a corda que está esticada possa vir a partir”.
O primeiro-ministro não disse, como seria exigível a um estadista, que o governo não exigirá mais que os portugueses podem legitimamente dar. Disse, como não devia, que o governo se está marimbando para o que os portugueses podem pagar. O governo vai exigir-lhes o coiro e o cabelo, o que podem ou não podem, reduzindo-os à miséria, se necessário for, porque o que interessa é cumprir os objectivos estabelecidos pela malfadada tróica. Mesmo que para os concretizar seja necessário reduzir os portugueses a escravos ou a emigrantes. Esta gente que ocupa provisoriamente S. Bento borrifa-se para que haja milhares de crianças que chegam à escola sem tomar o pequeno-almoço, milhares de idosos sem condições para suportar o “assalto à mão armada” que são as novas rendas ou que haja muitos milhares de portugueses que se vejam obrigados a abandonar as suas casas, os seus sonhos de toda uma vida, porque não conseguem pagar as suas contas ao fim do mês. São obrigados a pagar as contas do Estado, que não contraíram, e para as quais tem de haver responsáveis e não conseguem pagar os seus compromissos pessoais. Será legal e constitucional essa situação? Só num país de papel, isso acontece!...
5. Enquanto a vizinha Espanha, vai negociar com Bruxelas e com o Fundo Monetário Internacional um abrandamento da austeridade, para que os cortes orçamentais não acelerem a retracção da economia, o primeiro-ministro português recusa-se a falar em «espiral recessiva» e o ministro das finanças até se mostra «optimista» e antecipa um «ciclo virtuoso» para a economia portuguesa. Estão a gozar connosco, e nós a vermos!...
São os governantes a que temos direito!...
 
(Texto de opinião publicado no Correio do Minho de 18/02/2013)

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