Numa época em que dominavam os homens, em Fafe salientou-se uma mulher de elevado gabarito e que atingiu dimensão nacional. Porventura pela sua fortuna e por ter sido esposa de um republicano de antes quebrar que torcer: o Dr. José Summavielle Soares, que foi presidente da Câmara na I República, introdutor da electricidade em Fafe, criador do Teatro-Cinema de Fafe e administrador e proprietário da Fábrica do Bugio. Mas também porque ela própria se imbuiu do mesmo espírito e da mesma ideologia e acabou por transformar-se numa das maiores defensoras da I República.
Falamos de Laura Soares d’Oliveira Summavielle, considerada uma figura destacada na defesa do republicanismo e dos direitos das mulheres, ainda antes da eclosão da revolução de 5 de Outubro de 1910.
Nasceu em Fafe, na rua Monsenhor Vieira de Castro, em 23 de Março de 1879, filha de João Soares de Oliveira, farmacêutico no Hospital e de Joaquina Mendes da Costa, doméstica.
Laura Summavielle nasceu no seio de uma família abastada, cuja fortuna foi construída no Brasil e aos 24 anos casou com o advogado José Summavielle Soares, também ele de uma família de fortuna, por via do seu avô José Florêncio Soares, “brasileiro” que foi presidente do município, promotor da construção do Hospital da Misericórdia e fundador da Fábrica do Bugio (1873).
O marido, José Summavielle Soares, foi quem proclamou a República, das varandas dos Paços do Concelho, em 9 de Outubro de 1910.
Dentro desse espírito ideológico, actuou Laura Soares d’Oliveira Summavielle, mãe de uma plêiade de dez filhos: 4 mulheres, Laura (futura esposa do Dr. Maximino de Matos), Maria Margarida (casada com Augusto da Cunha Mendes), Alice (casada com o Dr. Alexandre Freitas Ribeiro) e Soledade (a maior poetisa fafense, casada com João Camilo), e 6 filhos varões, José, João (casado com Maria Miquelina Martins Campos), Miguel (falecido em 1945 com 30 anos), Luís (casado com Maria Adélia Félix da Costa), Fernando e Elísio Summavielle Soares (casado com Maria de Lourdes Costa Santos).
Casa Summavielle, na rua Monsenhor Vieira de Castro, onde Laura Summavielle viveu com seu marido e numerosa prole |
Sempre que se assinalava a data comemorativa do 5 de Outubro, Laura pendurava na sacada da sua habitação a bandeira nacional, mesmo nos momentos mais adversos, como sucedeu por altura do sidonismo (1918).
Laura Summavielle pertenceu à Cruzada das Mulheres Portuguesas, tendo sido dirigente da subcomissão de Fafe.
Durante a I Grande Guerra Mundial, promoveu projectos de assistência às crianças e às mulheres.
Isabel Cluny, no Dicionário Feminino (séculos XIX e XX), escreveu que Laura Summavielle “parece ter-se empenhado bastante neste trabalho, cuja vertente de assistência social deixava antever a propaganda feminina republicana”.
Laura Summavielle manteve-se intransigente na defesa dos ideais republicanos, mesmo durante o Estado Novo, em que não deixou de exigir o seu direito de voto nas eleições presidenciais e continuou a hastear bandeiras republicanas na sacada da sua residência e no Teatro-Cinema, em frente, ambos na rua Monsenhor Vieira de Castro.
Traseiras da mesma belíssima casa brasileira, edificada em 1862 |
Altruísta e bairrista, amante da sua terra, forneceu, de uma pereira que possuía no lugar de Pardelhas, toda a pedra para acabar de levantar a Igreja Nova de S. José, que como se sabe começou em 1895 e apenas foi sagrada em 1961. Isto, além dos donativos que deu para a mesma igreja, e que terão sido vultosos.
Faleceu em 14 de Abril de 1971 (dois anos depois do marido e, curiosamente, dois dias antes do seu genro Dr. Alexandre de Freitas Ribeiro, que contava apenas 64 anos de vida), com 92 anos, em perfeita lucidez, apesar da provecta idade, depois de ter viajado por diversos países europeus, “sozinha ou acompanhada por amigas, o que era pouco vulgar na época as mulheres fazerem” (Fátima Mariano).
Por altura do falecimento, o semanário local O Desforço, escrevia que a saudosa senhora era uma pessoa muito viajada, inteligente e culta. “A senhora D. Laura Summavielle era uma pessoa expansiva, alegre, comunicativa e com veia poética. Os seus versos, que ela por vezes improvisava, tanto em família, como entre pessoas amigas, faziam um livro. Dizia os seus versos para dar expansão à sua alegria, pois era uma senhora alegre e bem disposta” – acrescentava o periódico.
Era além de tudo uma senhora muito caritativa, nunca se esquecendo dos seus pobres do Asilo, da Conferência de S. Vicente de Paula, dos doentes do Hospital e outros necessitados.
Bibliografia: “Em Defesa da República”, de Fátima Mariano, Jornal de Notícias, 4 de Setembro de 2010, p. 11; Fafenses nascidos no século XIX – Perspectiva Histórico-Biográfica, 2ª edição, de Luís Gonzaga Ribeiro Pereira Silva, ed. Câmara Municipal de Fafe, 2010, pp. 160-161; Fafe dos “Brasileiros” (1860-10930): perspectiva histórica e patrimonial, de Miguel Monteiro, 1991, pp. 192-196; O Desforço, 22 de Abril de 1971.
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