domingo, 31 de outubro de 2010

HOSPITAL À BEIRA DO COMA PROFUNDO

O semanário Notícias de Guimarães desta sexta-feira titula, na primeira página, “Centro Hospitalar do Alto Ave – Hospital Senhora de Oliveira e S. José (Fafe) à beira do coma profundo”. A uma primeira leitura, o assunto é de molde a preocupar qualquer cidadão que habite na região servida por aquela unidade hospitalar.
Numa das páginas interiores, são relatadas as preocupações (sob anonimato, obviamente, porque ninguém quer dar a cara nesta democracia incompleta…) de profissionais de saúde (médicos, enfermeiros, pessoal auxiliar e administrativo) do Centro Hospitalar, que descrevem a situação como estando “à beira do coma profundo”.
Denunciam que “começa a faltar tudo”, fraldas, esponjas para limpar os doentes, agulhas, compressas, paracetamol, até o oxigénio começa a faltar.
E a propósito, é referido que “no hospital de Fafe já foram adiadas cirurgias por não haver oxigénio”.
Como é costume em situações que tais, a administração chuta para canto e garante que está tudo bem, como se os profissionais de saúde tivessem como desporto favorito vir para os jornais nomear situações inexistentes. É dos catecismos...
Por seu turno, o nosso Correio de Fafe noticia, no mesmo dia, que o “Hospital de Fafe só realiza operações que não carecem de internamento”. Os casos mais complicados passaram para Guimarães.
Como rebuçado, para acrescentar à recém-criada Unidade de Cirurgia Ambulatória, prometem para Novembro a consulta externa em três novas especialidades: Imunoalergologia, Urologia e Ginecologia. Meros paliativos que se ganham, obviamente, que não fazem esquecer o muito que se tem perdido.
O Hospital de Fafe, que historicamente foi um marco referencial na área da saúde para o nosso município e para a região de Basto, um orgulho para os fafenses, um hospital de dimensão e bem apetrechado, foi perdendo valências, serviços e competências, além de pessoal, sendo sucessivamente desertificado e é hoje em dia pouco mais que uma extensão do centro de saúde. Não fora a existência de internamento em medicina, que ainda persiste, embora com vida incerta, ao que se presume, e os meios auxiliares de diagnóstico, o Hospital de Fafe pouco passava de um mero centro de saúde. Perdeu diversos serviços ao longo dos últimos anos e muito recentemente foi desertificado das unidades de cirurgia e ortopedia. É pouco menos que um fantasma erguido num casarão que já foi grande. Até a autonomia de um mero número de telefone o nosso (dito) Hospital perdeu: hoje, ainda que se esteja no centro da cidade de Fafe, a 200 metros do Hospital, quem quiser contactar com o mesmo tem de ligar a Guimarães, que transfere a chamada para Fafe.
Uma tristeza, sem dúvida, quando deveria ser reforçado para melhor servir a população fafense e a de Basto! Um país descentralizado assim aconselharia... Mas a política actual é absolutamente centralista, como se sabe, embora não se assuma e ainda que acene a regionalização lá para as calendas gregas...
Como fafense, e vistas as notícias deste fim-de-semana, que não constituem qualquer novidade, de resto, só posso estar profundamente inquieto e inseguro quanto à instituição de saúde que me pode valer em caso de doença. Uma diarreia, curo-a alegremente no centro de saúde, durante o dia; uma dor de barriga, trato-a em duas penadas no Hospital, durante a noite.
Para um caso mais complicado, e que espero nunca me acometa, já sei que tenho guia de marcha para o pomposamente designado (mais pompa que serviço…) Centro Hospitalar do Alto Ave, onde me arrisco a esperar uma dezena de horas, no mínimo, pelo atendimento. As urgências estão congestionadas, porque aí acorrem centenas de milhares de pessoas de toda a região. Ao contrário do que prometeram os políticos centrais quando esvaziaram o Hospital de Fafe, o de Guimarães não sofreu aumento de instalações nem de recursos materiais e humanos, pelo menos dos que trabalham com os doentes, ao que se ouve.
O que parece é que o esvaziamento e desertificação dos hospitais públicos pretende "empurrar" os utentes para os hospitais privados e para os seguros de saúde. Porque importa poupar na factura da saúde, para mais num tempo de crise que os doentes e acidentados não provocaram.
Chama-se a esta mascarada "garantia e reforço do Estado Social"!...

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

É NO POEMA QUE NASCE E ESTÁ A LIBERDADE

Num tempo de escuridão, o poema – o que quer que isso seja, nem que a pura escrita das manhãs que acordam numa aldeia minhota – é um lugar de luz. Como escrevia Sophia, é no poema que está e nasce a liberdade.
É o exercício dessa liberdade livre que funda e permanece no acto de quem escreve, não para mudar o mundo (que a palavra não tem dotes taumatúrgicos…) mas para se tornar mais humano, mais divino, mais puro e solidário.
Contra as sombras, as mediocridades, as ervas daninhas do quotidiano, a poesia – e em geral, a escrita – instaura-se como chama, incêndio, fulgor. O fogo da diferença, essa missão indeclinável e apetecível de ser aurora da criação, catedral de sentimentos, discurso directo do coração.
O dia a dia é a consagração da vulgaridade, da abrupta e aborrecida normalidade, da mais insidiosa e estúpida telenovela da vida: dos que se esquecem de viver, dos que transferem a sua vida para os ecrãs da fantasia, dos que recusam a utopia em nome de rasteiros interesses.
A escrita nasce da opção por um estado outro de ser, de estar e de querer. A denegação dos bichos da terra vis e tão pequenos de que se lamentava Camões, nos Lusíadas, essa epopeia patriótica que a Escola hoje desvaloriza, ou menospreza, num crime de lesa-cultura, não por culpa própria, naturalmente, mas por decisões vindas dos estúpidos poderes que vamos suportando. É a libertação de asas e grilhetas que agarram os humanos à terra; é o voo fantástico em busca da eternidade.
Quer dizer, da luz.
Escrevo, não como quem respira, óbvio, nem como obrigação de me sacrificar em cinco milhares de caracteres diários, longe disso, mas quando me dá na real gana e com o esforço próprio de quem poda os galhos de uma estátua que vai esculpindo, ao sabor do momento e da emoção que transporta.
Escrever incomoda como andar à chuva, parafraseando Pessoa. Mas não me importo de uma boa molha, para expressar as minhas inquietações, os meus anseios, as minhas alegrias, que possa partilhar com os leitores deste blogue... Como tenho feito até agora, parece-me.

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

DIA DO AUTOR BRASILEIRO NA ESCOLA SECUNDÁRIA DE FAFE

Numa louvável iniciativa de grande interesse para os estudantes, a Escola Secundária de Fafe, através dos professores Carlos Afonso, Rosinda Leite e Augusto Lemos, promoveu a evocação do Dia do Autor Brasileiro, ao longo de todo o dia desta quarta-feira. Nele participaram largas dezenas de alunos dos 11º e 12º anos, sobretudo da área da Língua Portuguesa. Estes cantaram, dançaram, leram poesia de autores do lado de lá do Atlântico, teatralizaram diálogos entre personagens portuguesas e brasileiras.
Tive o privilégio de participar, de manhã, na sessão que contou com a presença da directora, Dra. Natália Correia, dos organizadores e da Dra. Isabel Pinto Bastos, que falou sobre Cecília Meireles (Augusto Lemos também teceu rasgados elogios à obra Olhai os Lírios do Campo, de Erico Veríssimo).
Fui convidado a dissertar sobre o tema "Fafe dos Brasileiros". Lembrei a longa emigração de fafenses para o Brasil, desde o século XVIII e em especial entre a segunda metade do século seguinte e os anos trinta do século XX, e realcei o rico legado que os brasileiros ricos, no seu retorno, deixaram na cidade, desde a criação das primeiras grandes indústrias (Fábricas do Bugio, em 1873 e do Ferro, em 1886), a promoção da Misericórdia (1862) e do Hospital de S. José (1863), a criação do Asilos para meninas desvalidas (1877) e para inválidos (1906), fundados, respectivamente, pelos brasileiros António Joaquim Vieira Montenegro e Manoel Baptista Maia, a intervenção no Jardim do Calvário (1892) e no arranque da Igreja Nova (1895), entre outros.
Mas a maior herança foi marcada na grandiosidade, beleza, ostentação e singularidade dos palacetes e casas apalaçadas que os emigrantes fafenses, regressados de Vera Cruz, implantaram, às dezenas, na então Vila de Fafe e que constituem hoje a mais emblemática arquitectura da cidade, uma autêntica "capital dos brasileiros", com as suas amplas varandas de ferro, as suas fachadas azulejadas, as suas belíssimas clarabóias encimadas por cata-ventos. Uma palavra ainda para monumentalidade funerária como símbolo da distinção social dos brasileiros: demonstravam a sua riqueza em vida, também queriam sobressair nos cemitérios, com as altas colunas de granito encimadas pelos respectivos bustos.
Abordei ainda a homenagem que Fafe promoveu ao Brasil, outorgando nomes de ruas e avenidas à terra-irmã (Praça do Brasil, Avenida do Brasil, Parque Cidade de Porto Seguro...) e enumerei alguns brasileiros ilustres descendentes de fafenses, como os que refiro a seguir:
Afonso Augusto Moreira de Pena – Presidente da República (1906-1909) – neto materno do fafense José Gonçalves Moreira (Moreira do Rei)
Jucelino Kubitschek de Oliveira - Presidente da República (1956-1961) – descendente por via paterna de Pio de Oliveira (Freitas)
Álvaro Siza Vieira – um dos dez melhores arquitectos do mundo – neto paterno de um emigrante de Vila Cova
António Carlos Magalhães – governador da Bahia, senador estadual e ministro – neto de José Maria Peixoto de Magalhães (Medelo)
Ailton Fernandes - vice-ministro da Agricultura do Brasil – filho de Artur Fernandes da Silva (Travassós).
Finalmente, abordei um desses descendentes mais eméritos, este na área da literatura. Falo do escritor João Ubaldo Ribeiro, Prémio Camões 2008, amigo de Jorge Amado, habitante da Bahía, considerado porventura o maior escritor brasileiro da actualidade. Era neto do fafense João Ribeiro, que abalou para a cidade de Penedo, Estado de Alagoas, no Brasil, nos primeiros anos do século XX, meio deportado pela família, porque engravidara uma vizinha solteira numa das aldeias de Fafe e que chegou a gerente de uma fábrica têxtil, pertencente a uns portugueses amigos da família. Por lá ficou.

Ubaldo Ribeiro, autor de uma obra já vasta e com diversos prémios coleccionados, além de três casamentos, é, pois, neto de um minhoto de Fafe.
Há uma década atrás, João Ubaldo esteve no Porto a apresentar A Casa dos Budas Ditosos, que vendeu só no nosso país, em pouco mais de dois meses, mais de 13 000 exemplares e cuja comercialização foi na altura proibida por duas cadeias de hipermercados, por alegada ofensa ao pudor. Na ocasião, estivemos com o escritor que fez questão de recordar o seu avô fafense, uma pessoa adorável, que lhe dava dinheiro para livros, revistas e guloseimas. João Ubaldo gostava muito do avô, grande companheiro de infância, amigo e confidente, pessoa culta e, incrivelmente, para um brasileiro, leitor apaixonado de Camilo e Guerra Junqueiro. Afiançava mesmo que lhe deve muito, talvez até a carreira de escritor, sendo que o seu avô considerava que só tinha direito ao estatuto de escritor aquele que escrevia livros que davam para pôr de pé. Por isso, João Ubaldo, certamente em sua memória e vincando a sua legitimidade de (grande) escritor, publicou Viva o Povo Brasileiro, um romance histórico com perto de 700 páginas e seguramente a sua melhor e mais conhecida obra literária, considerada já um clássico da literatura brasileira contemporânea.
O escritor é autor de um bom número de obras nas áreas do romance, do conto, do ensaio e da crónica. Está traduzido em alemão, dinamarquês, espanhol, francês, hebraico, inglês, italiano, jugoslavo e sueco e é titular de honrosos prémios literários. Diversas obras suas foram adaptadas para o cinema e para televisão.

terça-feira, 26 de outubro de 2010

MUNICÍPIO OFERECE AOS FAFENSES RECITAL COM MÚSICA DA 1ª REPÚBLICA

Depois de um espectáculo que lotou o Teatro-Cinema de Fafe, sábado passado, com os impagáveis João Seabra e Miguel 7 Estacas, a programação prossegue esta sexta-feira à noite.
A autarquia vai oferecer à comunidade local o recital “Centenário da República – A Música em 1910”, pelo grupo Vox Angelis, que tem lugar no Teatro-Cinema da cidade, na noite (21h30) de 29 de Outubro.
Dado o cariz do espectáculo, o mesmo foi inserido no quadro das comemorações do Centenário da Proclamação da República que têm vindo a decorrer em Fafe.
Os espectadores interessados podem levantar os ingressos no Posto de Turismo, como habitualmente ou, à hora do espectáculo, no Teatro-Cinema. Naturalmente, que apenas acederá à sala quem se munir do respectivo bilhete.
Neste concerto, são executadas obras de compositores portugueses contemporâneos da Revolução Republicana (homens como Luís de Freitas Branco e Francisco de Lacerda, entre outros), bem como obras compostas precisamente na altura da Instauração da República.
Pretende-se, com isso, fazer recuar o público a 100 anos atrás, através da audição da música que se interpretava naquela época e que muito fala da vivência cultural e, com isso, evocar historicamente os acontecimentos de 1910.
Em palco vão estar sete músicos: os cantores Pedro Miguel Nunes e Maria José Carvalho e os intrumentistas Serguey Arutiunian (1º Violino), Larissa Shomina (2º Violino), Katarzyna Pereira (Viola d’ Arco), Jaroslav Mikus (Violoncelo) e Katherine Fiero (Harpa).

sábado, 23 de outubro de 2010

LUTERANO INCORRIGÍVEL

Faço minhas as palavras judiciosas que Lutero pronunciou há quase quinhentos anos, para mais numa altura grave do viver português e internacional.
Nesse sentido (e só nesse), assumo-me luterano incorrigível.
Estamos demasiado sisudos, taciturnamente engravatados, embebidos umbilicalmente na crise, para que possamos dar um ar da nossa graça.
Será que não se pode rir no céu? Será que estamos condenados a chorar na Terra? Ate à eternidade?
Gosto de rir, e de sorrir, libertar o meu lado bem-disposto, de forma a tornar menos penosa a existência. As rugas na testa dão a medida dos anos a tocar a vida com o astral em cima, mesmo que a vontade às vezes não seja tanta de abrir os lábios num sorriso que ilumine cada dia...
Volto a Lutero: se não se pode rir no céu, não quero ir para lá. Para o paraíso muito menos. Para o inferno, nem pensar. Ele está por aqui ao virar da esquina.
Para desopilar, quero partilhar um poema de um extraordinário poeta contemporâneo, Joaquim Pessoa, nascido em 1948 e autor de duas dezenas livros de poesia (e também letras de imensas canções que por aí se trauteiam), o qual me foi remetido por um amigo.
Tem a ver com o quotidiano, com o presente, com quem nos coloca entre insuportáveis tenazes. Um poema que dá para sorrir. E para pensar, tão actual e forte é a sua mensagem.

Poema de agradecimento à corja

Obrigado, excelências.
Obrigado por nos destruírem o sonho e a oportunidade
de vivermos felizes e em paz.
Obrigado
pelo exemplo que se esforçam em nos dar
de como é possível viver sem vergonha, sem respeito e sem
dignidade.
Obrigado por nos roubarem. Por não nos perguntarem nada.
Por não nos darem explicações.
Obrigado por se orgulharem de nos tirar
as coisas por que lutámos e às quais temos direito.
Obrigado por nos tirarem até o sono. E a tranquilidade. E a alegria.
Obrigado pelo cinzentismo, pela depressão, pelo desespero.
Obrigado pela vossa mediocridade.
E obrigado por aquilo que podem e não querem fazer.
Obrigado por tudo o que não sabem e fingem saber.
Obrigado por transformarem o nosso coração numa sala de espera.
Obrigado por fazerem de cada um dos nossos dias
um dia menos interessante que o anterior.
Obrigado por nos exigirem mais do que podemos dar.
Obrigado por nos darem em troca quase nada.
Obrigado por não disfarçarem a cobiça, a corrupção, a indignidade.
Pelo chocante imerecimento da vossa comodidade
e da vossa felicidade adquirida a qualquer preço.
E pelo vosso vergonhoso descaramento.
Obrigado por nos ensinarem tudo o que nunca deveremos querer,
o que nunca deveremos fazer, o que nunca deveremos aceitar.
Obrigado por serem o que são.
Obrigado por serem como são.
Para que não sejamos também assim.
E para que possamos reconhecer facilmente
quem temos de rejeitar.
Joaquim Pessoa

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

RUAS DA REPÚBLICA, EM FAFE (I) - MAJOR MIGUEL FERREIRA


Ruas da República, em Fafe. Passados 100 anos. Ruas sobre a República. Ruas em homenagem a republicanos ilustres neste concelho e nesta cidade. Para conhecimento dos leitores e reforço da identidade fafense. Porque a história é isso mesmo: o espelho da nossa alma.
Começamos com uma das figuras mais distintas da mundividência republicana e democrática, perenizada justamente numa das artérias urbanas.
Oficial do Exército e político antifascista, Miguel Augusto Alves Ferreira nasceu na freguesia de Tecla (Celorico de Basto), em 06 de Abril de 1878, no seio de uma ilustre família de Basto, vindo mais tarde para Fafe, para a “Quinta do Ribeiro”, em Antime, onde viria a constituir família, a viver a vida em prol da Liberdade e da Democracia e a falecer, em 04 de Abril de 1961.
Frequentou a Academia Politécnica do Porto, a Universidade de Coimbra e a Escola do Exército, onde concluiu o curso da arma de Infantaria, ingressando como alferes no exército, em 1902. Passou depois à reserva, para mais livremente poder expandir as suas ideias republicanas. No entanto, sempre que entendeu ser essa a melhor forma de servir o seu país e os seus ideais, voltaria à vida militar activa, quer combatendo na Flandres, em plena I Grande Guerra Mundial, quer comandando unidades militares. No exército, chegou ao posto de Major, em 1917.
Miguel Ferreira tomou parte activa em todos os movimentos revolucionários tentados no Porto para derrubar a monarquia. Como activista, integrou a Carbonária e participou na fabricação de um considerável número de bombas destinadas a fins revolucionários. Tudo fez para que a República fosse implantada no nosso país, ajudando a reforçar o Partido Republicano, de que foi líder em Fafe.
Rejubilou assim, naturalmente, com o 05 de Outubro de 1910, tendo sido nomeado de imediato membro da Comissão Municipal Republicana, presidida pelo Dr. Gervásio Domingues de Andrade e que integrava ainda o Dr. José Summavielle Soares, José Gabriel Magalhães e Menezes, José Augusto Ferraz Costa, Vicente d’Oliveira e Castro e Bernardino Monteiro. O vereador Miguel Ferreira tinha a seu cargo o sector das águas, cemitério e jardim.
Foi depois eleito deputado às primeiras Constituintes de 1911, pelo Círculo de Guimarães e em nome do Partido Republicano Português, na altura, chamado Partido Democrático. O primeiro mandato decorreu entre 1911 e 1915. Voltaria à Câmara dos Deputados na legislatura de 1919-1921.
Mais tarde, e já no findar do regime republicano, exerceu as funções de Governador Civil de Braga, entre 18 de Setembro de 1925 e 08 de Fevereiro de 1926.
Após o 28 de Maio daquele fatídico ano, o Major Miguel Ferreira remeteu-se naturalmente à oposição ao regime e participou, logo em 03 de Fevereiro de 1927, na mais importante revolta organizada contra a nova situação. Foi no Porto, sob o comando do General Sousa Dias. Na altura, Miguel Ferreira era comandante do Regimento de Infantaria 20, em Guimarães. Aderindo à revolta, foi de imediato demitido do cargo e obrigado a exilar-se. Entrou na resistência activa ao Estado Novo, participando em todas as lutas contra a ditadura. Participou no MUD, em 1945, na campanha de Norton de Matos, em 1949 e na de Humberto Delgado, na década seguinte. Em 1959, já com 80 anos de idade, ousou afrontar directamente Salazar, ao ser o primeiro subscritor de um manifesto intitulado “Aos Portugueses” e que terminava, apelando ao ditador para que abandonasse “voluntariamente o poder”. Com esse acto de indiscutível bravura politica, Miguel Ferreira ficou na história da resistência em Portugal.
Já não viu nascer o sol do dia 04 de Abril de 1961, tendo sido sepultado no cemitério de Antime, sob a atenta vigilância da PIDE.
Por proposta do então presidente da Comissão Administrativa da Câmara Municipal de Fafe, Dr. Parcídio Summavielle e deliberação desta de 03 de Junho de 1974, o nome do Major Miguel Ferreira passou a figurar na toponímia local, em substituição da então denominada “Rua Henrique Cabral”, que havia sido baptizada como “Rua Cândido dos Reis”, logo a seguir ao 5 de Outubro de 1910, em homenagem a um dos activistas maiores do republicanismo, que se suicidou em 4 de Outubro, julgando fracassada a revolução.

Bibliografia: Artur Ferreira Coimbra, Major Miguel Ferreira, uma Lição de Liberdade, Fafe, ed. Câmara Municipal, 1995.

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

O PRISMA DAS MUITAS CORES - ANTOLOGIA DE POESIA LUSO-BRASILEIRA EDITADA EM FAFE


A mais recente obra com a chancela da editora fafense Labirinto tem o título O prisma das muitas cores, é uma antologia de poesia de amor portuguesa e brasileira e a edição tem o apoio da Câmara Municipal de Fafe e do Museu das Migrações e das Comunidades Portuguesas.
A apresentação foi feita por estes dias na Livraria Bulhosa, de Entrecampos, em Lisboa e oportunamente será efeita em Fafe e em outras localidades portuguesas.
A edição, com mais de duzentas páginas, organizada pelo poeta Victor Oliveira Mateus, compila 135 poetas contemporâneos, oriundos de Portugal e do Brasil, num tributo à língua portuguesa e ao amor. A obra conta ainda com um prefácio de António Carlos Cortez, onde se pode ler que se a generalidade dos leitores não vai até à poesia, compete à poesia ir ter com os leitores, sem que isso signifique empobrecimento da própria linguagem poética.
Como foi sublinhado em Lisboa, e nós partilhamos, a nossa editora Labirinto continua, gloriosamente, a afirmar-se como uma editora com caminho feito na área da poesia, constituindo uma referência no plano editorial nacional neste género literário.

Dos 135 poetas antologiados, cinco são de Fafe: António de Almeida Mattos, Artur Ferreira Coimbra, Carlos Ferreira Afonso, João Ricardo Lopes e Pompeu Miguel Martins.
Aqui fica a extensa relação dos restantes, grande parte deles "monstros sagrados" da poesia de expressão portuguesa:
Adalberto Alves, Agripina Costa Marques, Albano Martins, Alberto da Costa e Silva, Alberto Soares, Alexandre Bonafim, Alexei Bueno, Alice Fergo, Alice Vieira, Álvaro Cardoso Gomes, Amélia Vieira, Ana Hatherly, Ana Luísa Amaral, Ana Miranda, António Brasileiro, António Cardoso Pinto, António Carlos Cortez, Antonio Carlos Secchin, António Cícero, António José Queiroz, António Manuel Couto Viana, António Miranda, António Ramos Rosa, António Salvado, Carlos Nejar, Carlos Vaz, Casimiro de Brito, Cláudio Lima, Cláudio Neves, Cleri Aparecida Biotto Bucciolli, daniel gonçalves, Direceu Villa, Donizete Galvão, E. M. de Melo e Castro, Ernesto Rodrigues, Eunice Arruda, Fernando Esteves Pinto, Flávio Moreira da Costa, Floriano Martins, Florisvaldo Mattos, Gilberto Mendonça Teles, Gisela Ramos Rosa, Glória de Santa’anna, Gonçalo Salvado, Graça Pires, Hélia Correia, Henrique Levy, Henrique Manuel Bento Fialho, Hugo Milhanas Machado, Iacyr Anderson de Freitas, Ildásio Tavares, Inês Lourenço, Isabel Wolmar, Ivan Junqueira, Jaime Rocha, João de Mancelos, João Negreiros, João Rui de Sousa, Joaquim Cardoso Dias, Joel Henriques, Jorge Reis-Sá, José Agostinho Baptista, José do Carmo Francisco, José Emílio-Nelson, José Félix Duque, José Jorge Letria, José Manuel Capêlo, José Manuel Mendes, Juliana Miranda, Lara de Lemos, Lêdo Ivo, Luís Adriano Carlos, Luís Filipe Cristóvão, Maiara Gouveia, manuel a. domingos, Manuel Madeira, Manuel Neto dos Santos, Marco Lucchesi, Margarida Vale de Gato, Maria Alberta Menéres, Maria Andresen, Maria Augusta Silva, Maria Azenha, Maria do Carmo Campos, Maria Carpi, Maria Estela Guedes, Maria João Fernandes, Maria Lucília Meleiro, Maria Quitans, Maria do Rosário Pedreira, Maria do Sameiro Barroso, Maria Teresa Dias Furtado, Maria Teresa Horta, Maria Toscano, Mariana Ianelli, Mário Cláudio, Matilde Rosa Araújo, Miguel-Manso, Milton Torres, Myriam Fraga, Neide Archanjo, Nuno Dempster, Nuno Júdice, Olga Savary, Paulo Franchetti, Paulo Moreiras, Paulo Tavares, Pedro Lyra, Pedro Sena-Lino, Renata Pallottini, Ricardo Domeneck, Rodrigo Petronio, Rosa Alice Branco, Rui Almeida, Rui Coias, Rui Costa, Rui Lage, Ruy Espinheira Filho, Ruy Ventura, Seomara da Veiga Ferreira, Ségio Nazar, Teresa Rita Lopes, Teresa Vieira, Tiago Nené, Urbano Tavares Rodrigues, valter hugo mãe, Vera Lúcia de Oliveira, Vergílio Alberto Vieira, Victor Oliveira Mateus e Vítor Oliveira Jorge.

O poema de minha autoria inserto na colectânea dedica toda a minha paixão pela deusa, mulher, amante, mãe, companheira de todos os momentos que me apoia desde há três décadas, sem desfalecimentos e para quem vai todo o meu amor, nos termos que se seguem:

É ASSIM QUE TE AMO

É assim que te amo.
Como os pinheiros a resina
segregam, desenredando-se da Primavera.
Como o sol se eleva por sobre as colinas
dos dias que a luz sobressalta, em rapidez de cal.

Amo-te pelos dias que me sonham,
em Maio ou em Setembro,
no calor das papoilas à procura do carmim.

Às vezes, anoiteço, a alma seca,
sepulcral de te esperar.
É um cais. Um olhar. Um mundo
inteiro, à procura da tua voz,
do veludo do teu sorriso
desabrochando nas ondas
deste querer-te infindo

É assim que te amo.
Como as palavras me viajam, silenciosas
querendo grafar teu nome
com o fogo de oiro das estrelas
que desenham o meu céu.

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

PORTUGUESES MASSACRADOS

1. Portugal tem sido, nos últimos vinte anos de democracia, pelo menos, um país governado por interesses meramente eleitoralistas e não por estadistas que cuidem dos reais interesses dos cidadãos, individual e colectivamente considerados. Ninguém quer arriscar-se a perder votos e os resultados estão à vista: um país miserável, a naufragar alegremente para o abismo.
É claro que a responsabilidade primeira do descalabro em que caíram as contas do país, no mais recente quinquénio, é do primeiro-ministro José Sócrates, que não explicou ainda minimamente aos portugueses as razões por que se chegou até aqui. Ou seja, porque é que esticou a corda, irresponsavelmente, até finais de Setembro, quando todos viam que o precipício se aproximava a passos largos; porque é que não tomou medidas mais suaves com maior antecedência, agravando a situação até ao insustentável; porque é que agiu com meros intuitos de “caça ao voto” em 2009, numa altura em que os especialistas já prenunciavam nuvens negras sobre a economia doméstica, aumentando ordenados; porque é que manifestou incompetência em prever a evolução da economia, afirmando, reiteradamente, estar tudo “controlado”, quando a situação era já aflitiva; porque é que esbanjou milhões de euros dos impostos de todos os portugueses em dois bancos privados que acabaram por ir à ruína; porque é que deu razões sobejas a todos os portugueses para considerarem que um primeiro-ministro que aldraba, que mente, que não antecipa cenários, que não arquitecta as melhores soluções, não merece confiança para estar à frente de um governo da República.
José Sócrates, em condições normais, já não teria as mínimas condições para continuar a exercer as funções de chefe do governo. Faltou-lhe dimensão de estadista, de líder omnisciente, com visão e previsão de futuro. Ficou-se pelos jogos de interesse eleitoralista.
Contudo, vivemos por estes dias condições anormais, gravíssimas, que não se compaginam com a abertura da mais ligeira crise governativa. O país está em rotura financeira, como nos indicam os que percebem destas matérias e que nós, até agora, catalogávamos, descuidadamente, como catastrofistas e arautos do desgraça, até a razão se impor pelas circunstâncias.
Todo o país volta agora os olhos para Pedro Passos Coelho, no sentido de que venha a caucionar o “massacre aos portugueses” que representa o Orçamento de Estado para 2011, com as medidas de ataque feroz aos bolsos dos cidadãos, de empobrecimento generalizado, de recessão da economia.
Apesar de tudo, e para as coisas não piorarem, o que todos esperam, nesta calamitosa conjuntura, em que os suspeitos do costume, sobretudo os que vivem do seu trabalho na função pública, vão voltar a ser fortemente punidos, é que haja responsabilidade e sentido de Estado por parte de todos os intervenientes da cena política. Que haja diálogo, entendimento, concertação, acordo, para que o documento económico estrutural venha a passar na Assembleia da República. Pedem-no os portugueses em geral, votem neste ou naquele partido, ou não elejam nenhum deles. Pedem-no os antigos presidentes das República, como se viu esta semana; pede-o o presidente da Comissão Europeia; pedem-no os comentadores, os economistas, os opinadores.
Para que Portugal cumpra os compromissos que tem para com as instâncias internacionais e recupere a confiança dos mercados.
Caso contrário, arriscamo-nos a ter de suportar as medidas e os cortes introduzidos por estranhos, pagando todos com língua de palmo as asneiras, os esbanjamentos, a politiquice, o desperdício e o eleitoralismo de uns poucos!
2. Na sexta-feira passada, começou a ser, finalmente, paga a utilização das SCUT, as auto-estradas que todos remuneramos para que alguns nelas circulem.
Sobre esta questão, cumpre-me saudar retumbantemente a posição do presidente da Câmara de Santa Comba Dão, João Lourenço, do PSD, cujo executivo apoia portagens nas actuais SCUT. Dizia ele, citado pela imprensa da semana passada: “sou defensor do princípio da universalidade. O que neste caso significa que, em matéria de portagens, ou pagamos todos ou não paga ninguém”. E acrescenta: “As alternativas não podem ser iguais às auto-estradas. Se assim fosse, não eram alternativas mas sim estradas iguais às outras. Quem quer viajar com conforto e qualidade nas auto-estradas tem de pagar”.
Nem mais. Quantos anos andaram todos os portugueses a pagar as utilizações de alguns deles? Numa altura de crise, e que o não fosse, todas as auto-estradas (incluindo as ditas SCUT) devem ser pagas por quem as utiliza e não por todos os pagadores de impostos. É o princípio da justiça e da equidade que está em causa.
Como é de falta de justiça que se fala quando há outras inúmeras SCUT espalhadas pelo país e que continuam sem custos para o utilizador. Mas porque é que o Norte continua a ser martirizado, obrigado a pagar as trapalhadas do Senhor Engenheiro, quando o resto do país o não faz? Será este o tão propalado esforço de “coesão nacional”?!...

domingo, 17 de outubro de 2010

TRABALHADORES DO COMÉRCIO ENCANTARAM NO TEATRO-CINEMA DE FAFE


Foi esplêndido, fantástico, maravilhoso, o espectáculo que a banda portuense Trabalhadores do Comércio trouxe ao Teatro-Cinema de Fafe, na noite do passado sábado.
Apesar de ter trinta anos de formação, a banda liderada por Sérgio Castro introduz elementos jovens e sonoridades renovadas que se transformam num espectáculo de agrado abrangente, enriquecido por uma interactividade com o público que o líder do grupo consegue alimentar.
O grupo apresentou um concerto com mais de uma hora e meia, em que foi passando em revista alguns dos principais êxitos dos Trabalhadores e até temas do seu próximo álbum, com o título Gradiador. Além dos cinco músicos em palco, deram um especial relevo ao espectáculo as cantoras Diana Bastos e Daniela Costa, que interpretaram temas importantes da banda. E que vozes, meus Deus!...
Atrever-me-ia a considerar este um dos melhores concertos musicais que passou pelo Teatro-Cinema de Fafe desde a reabertura da sala há um ano e meio.
Um espectáculo que encantou, sem qualquer dúvida, os espectadores que tiveram o privilégio de a ele assistir.
Lamenta-se que, uma vez mais, a belíssima sala estivesse com cerca de metade da lotação, apesar de o ingresso custar apenas 5 euros.
Um espectáculo com esta qualidade merecia muito mais espectadores. Mas já se sabe como é nesta terra: se nada se faz, é um deserto; se se faz alguma coisa (e é inegável que se tem feito, apesar do subjectivismo da apreciação…), o pessoal enche os cafés e as esplanadas!
No mínimo, é frustrante. E não venham com a velha cassete da divulgação: pelo menos 2500 pessoas tiveram conhecimento directo do espectáculo, fora os que leram os jornais locais, os que viram os outdoors, os placares, as paragens dos autocarros e outros meios de promoção!...

Fotos: Manuel Meira Correia

sábado, 16 de outubro de 2010

LIVRO BIOGRAFA 100 ANOS DE DEPUTADOS E MINISTROS DO DISTRITO DE BRAGA

100 Anos da República 1910-2010 – Deputados, Procuradores, Senadores e Ministros naturais do distrito de Braga é o longo título da mais recente obra historiográfica do investigador barcelense Joaquim da Silva Gomes, que acaba de ser lançada no mercado, em edição apoiada pelo Governo Civil de Braga e pela Comissão Nacional para as Comemorações do Centenário da República.
É uma obra de elevado interesse historiográfico para o distrito e para o país e que compila informação sobre mais de centena e meia de parlamentares, procuradores, senadores e ministros naturais do nosso distrito que desempenharam funções no âmbito do poder deliberativo e executivo, entre 1910 e o ano em curso, ou seja, perpassando três períodos políticos fundamentais: a Primeira República, o Estado Novo e a Democracia pós 25 de Abril.
A obra é enriquecida com um texto introdutório feliz (o que nem sempre acontece com os políticos…) de António José Seguro, em que refere, designadamente: “É uma obrigação de todos preservar e elevar o nome da sua terra, da sua região e do seu país. É o que tem feito Joaquim da Silva Gomes, com os vários livros que tem editado, mas também com os trabalhos que regularmente publica no jornal Correio do Minho, há mais de vinte anos. (…) Ao recordar estes políticos, naturais do distrito de Braga e que exercerem cargos de grande responsabilidade no nosso país ao longo destes cem anos de República, Joaquim da Silva Gomes presta uma homenagem a todos eles, mas também a todos os que, anonimamente, deram o melhor de si durante este último século da nossa História”.
No caso de Fafe, são referidos, no quadro da Primeira República (1910-1926), os deputados Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso (que foi também ministro da Justiça, por três ocasiões, entre 1919 e 1923), Maximino de Matos e Miguel Augusto Ferreira (este, embora não fosse daqui natural, era-o afectiva e efectivamente). No Estado Novo, é referido o deputado professor Manuel Cardoso, enquanto na Democracia são referidos os deputados Eugénio Fernando de Sá Cerqueira Marinho, José Luís Campos Vieira de Castro e Laurentino José Monteiro de Castro Dias e o ministro Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes (embora apresentado, biograficamente, como tendo nascido em Guimarães…).
Falta nesta relação apenas (que nos recordemos) o nome de Albino Costa que, durante alguns anos, exerceu o cargo de deputado na Assembleia da República, pelo Partido Socialista.
Uma obra bem estruturada, informativa, objectiva, que se estende por 224 páginas.
O seu autor, Joaquim da Silva Gomes, nasceu em 1970, em Couto de Cambeses (Barcelos) e é licenciado em Ensino da História e Ciências Sociais pela Universidade do Minho.
É docente do ensino básico e secundário, mas tem-se dedicado paralelamente à investigação centrada na história local bracarense, tendo publicado sete livros desde 2002.
Um grande abraço de parabéns por mais esta obra!

domingo, 10 de outubro de 2010

QUATRO DIAS DEPOIS, A REPÚBLICA CHEGOU A FAFE

Há cem anos atrás, as comunicações não tinham a rapidez de hoje em dia e os acontecimentos repercutiam pelo país a velocidades diferentes.
Tomemos o caso da proclamação da República. Ela foi declarada solenemente da varanda da Câmara Municipal de Lisboa, pelas 11h00 do dia 5 de Outubro.
Porém, seria pelo telégrafo – como referem os historiadores – que a boa nova se transmitiria ao país, onde a proclamação ocorreu nos dias imediatos. No Porto, seria-o no dia 6 de Outubro, assim como em diversas outras cidades, o mesmo sucedendo nos dias imediatos, e até 16.
Em Fafe, a República seria proclamada na tarde de 9 de Outubro, um domingo, juntamente com mais uma dúzia de localidades.
Pelas três horas da tarde, a Comissão Municipal Republicana entrou no edifício dos Paços do Concelho (demolido poucos anos depois, que a gravura acima documenta), ao som da “Portuguesa”, tocada por uma banda de música. De imediato, o secretário da administração, Artur Teixeira da Silva e Castro, leu o auto de posse das novas autoridades, do seguinte teor:

Aos 9 d’outubro de 1910, e por ordem do Governo Provisório da Republica Portuguesa, compareceu n’estes Paços do Concelho, para assumir a gerência do município, o cidadão Snr. José Gabriel Peixoto de Magalhães e Meneses, com a seguinte comissão da sua presidência: Gervásio Domingues de Andrade, Miguel Augusto Alves Ferreira, Bernardino Monteiro, José Augusto Ferraz Costa, Vicente d’Oliveira e Castro, Dr. José Teixeira e Castro Guimarães e Dr. José Summavielle Soares.
Compareceu também o digno vice-presidente da Câmara destituída, Snr. Padre José da Silva e Castro, que conferiu a posse.
O cidadão Snr. José Gabriel Peixoto de Magalhães e Meneses e os restantes membros da Comissão da sua presidência declararam pela sua honra que farão por bem desempenhar as funções em que foram investidos.
Por proposta do presidente foi resolvido que a 1ª sessão se effectuasse na próxima 5ª feira, pela huma hora da tarde, para começar os trabalhos da gerência municipal.
Procedeu-se, seguidamente, á proclamação da Republica da varanda dos Paços do Concelho, e ao arvoramento da bandeira republicana.

A imprensa da época fala de uma transição pacífica do poder municipal, sendo que o monárquico Padre José da Silva e Castro afirmou que, “pessoalmente e com toda a sinceridade acatava do coração a nova forma do governo”. O futuro se encarregaria de demonstrar a sua falsidade.
Como a sala era pequena e havia imensos populares nas ruas da vila, o Dr. José Summavielle Soares assomou a uma das varandas dos Paços do Concelho e fez a proclamação da República, nos termos seguintes:

Cidadãos!
Em nome da Comissão que vem de ser investida na administração municipal, cabe-se a honra de proclamar a Republica neste concelho.
E, devo dizer-vos, proclamo-a profundamente comovido, porque vejo enfim realizada a aspiração mais ardente do meu coração de patriota.
Cidadãos:
Para derrubar a ominosa dynastia de Bragança e fazer triumphar a sagrada bandeira da Republica foi preciso verter-se, em combates verdadeiramente épicos, o sangue de muitos portuguezes.
Glorifiquemos esse sangue, abraçando, confiantes, as novas instituições republicanas e empenhando todo o noddo civismo na construcção d’uma Patria nova, dignificada e prospera.
Viva a Republica Portugueza!
Viva a Marinha de Guerra!
Viva o exercito!
Viva o grande, o nobre, o heroico povo de Lisboa!

As primeiras deliberações da República em Fafe

Oito dias depois, reunia a nova Câmara, recebendo os cumprimentos do último presidente da câmara monárquica, Miguel Gonçalves da Cunha e tomando duas importantes deliberações.
A primeira, teve a ver com a mudança da toponímia da então Vila, sendo aprovada por unanimidade uma proposta do Dr. José Summavielle Soares, no sentido da adopção das seguintes denominações:
Praça da República, para o largo de D. Carlos I (actual Praça 25 de Abril);
Avenida 5 de Outubro, para a Avenida José Luciano de Castro;
Rua Teófilo Braga, para a Rua do Príncipe Real (actual Praça 25 de Abril, sensivelmente entre a Escola Profissional e o começo da Rua Serpa Pinto);
Rua Cândido dos Reis, para a rua D. Maria Pia (actual Rua Major Miguel Ferreira);
Rua Miguel Bombarda, para a rua D. Luís I (actual Rua General Humberto Delgado);
Rua Machado dos Santos, para a Rua D. Pedro V (actual Rua João XXIII);
Rua Francisco Ferrer, para a Travessa D. Pedro V (actual Rua Afonso Costa).
Como se verifica, glorificavam-se a data heróica do 5 de Outubro e a República, através dos seus heróis (Teófilo Braga, velho republicano e sobretudo Machado dos Santos, o “herói da Rotunda”) e os seus mártires (o psiquiatra Miguel Bombarda, assassinado em 3 de Outubro, por um alienado, e o almirante Cândido dos Reis, que se suicidou no próprio dia 5 de Outubro, julgando perdida a revolução…).
Francisco Ferrer era um educador espanhol, fuzilado exactamente um ano antes pelas autoridades monárquicas do país vizinho…
Apenas a Avenida 5 de Outubro mantém a designação de há cem anos atrás, ainda assim vítima de uma alteração ocorrida durante o Estado Novo, quando se chamava Avenida General Carmona…
A segunda deliberação teve a ver com a distribuição dos pelouros dos eleitos:
Presidente, Dr. Gervásio Domingues de Andrade – Secretaria e Policia Municipal;
Vice-presidente, Dr. José Summavielle Soares – Obras e Higiene;
Vogal, Miguel Augusto Alves Ferreira – Águas, Cemitério e Jardim;
Vogal, José Gabriel Peixoto de Magalhães e Meneses – Instrução e Beneficência;
Vogal, José Augusto Ferraz Costa – Mercados, Limpeza e Iluminação;
Vogal, Vicente d’Oliveira e Castro – Matadouro, Açougues e Aferimentos;
Vogal, Bernardino Monteiro – Fazenda e Contabilidade.

Era o começo da “aventura republicana” em Fafe, que teria alguns contornos de interesse, que poderemos vir a contar, neste ano celebrativo do Centenário da sua gloriosa proclamação oficial!

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

REPUBLICANOS: SOMOS TODOS PORTUGUESES

Quando o Partido Popular Monárquico, neste caso de Braga, ocupa uma página de publicidade num jornal diário da capital do Minho, no dia mesmo do Centenário da Proclamação da República, em 5 de Outubro, afirmando “Monarquia: Porque somos portugueses!”, não está apenas a insultar a imensa maioria de cidadãos que trabalha, escolhe e vota instituições e autarquias republicanas, como a demonstrar, inequivocamente, pelo menos, a sua pequenez política e social.
Identificar os portugueses com a monarquia é, hoje por hoje, um abuso. Desde 1910 que o regime não é colocado em causa, nem pelas quixotescas escaramuças do paladino real Paiva Couceiro, em 1911/12 e 1919, nem pelo próprio ditador António de Oliveira Salazar, que se afirmava um “monárquico de coração”.
Mais grave é considerar, como a expressão propagandística insinua, que só os monárquicos são portugueses. Nos últimos 100 anos, uns escassos milhares, como a História regista. E os outros milhões de cidadãos que habitaram e habitam este território: são caucasianos?
Imaginava que a expressão monárquica, residual na sociedade portuguesa, como se sabe, que não consegue eleger um único dos 230 deputados do Parlamento, que não vence uma das 308 Câmaras e duvido que tenha uma Junta de Freguesia nas mais de 4 000 que se espalham pelo país, conseguisse demonstrar inteligência para ultrapassar o atávico complexo de inferioridade que a domina já desde o início do século XX. Verificamos agora que não. Os monárquicos quase não existem, mas insultam, injuriam, enxovalham, numa arrogância indesculpável, como se a sua dimensão tivesse algo a ver com a vontade de se mostrarem vivos.
O que vale é que a República é, pelo contrário, tolerante. É democrática, respeitadora, velando de igual modo pelas diferentes modalidades de expressão e pensamento.
A República instituiu-se historicamente em torno de ideias contrapostas à monarquia vigente desde os alvores da nacionalidade, fazendo prevalecer as da democracia e da soberania popular. Ao contrário da monarquia baseada na hereditariedade do rei e na soberania validada pela origem divina do poder, a República estriba o seu sistema nos princípios electivos, e com a autoridade a emanar directamente do povo, através dos sufrágios eleitorais realizados periodicamente. Por isso é que os políticos têm a obrigação de se assumirem “acima de qualquer suspeita”. A política só é uma actividade nobre se tiver como referência absoluta a ética e a lisura dos procedimentos, que inviabilizam qualquer deriva autoritária ou corrupta.
A República acaba também por reforçar alguns direitos humanos fundamentais, como os da liberdade, ao transformar os velhos súbditos em cidadãos, ou da igualdade que, ao negar os privilégios derivados do nascimento, confere aos cidadãos em geral a possibilidade de ascenderem a qualquer magistratura, o direito a eleger os seus representantes nas instituições democráticas (das juntas de freguesia à chefia do Estado) e a serem eleitos, dentro dos requisitos estabelecidos para cada acto eleitoral.
Além da consagração insofismável da soberania popular e da cidadania individual e colectiva, a República canonizou um outro princípio, que tanta polémica gerou e continua a gerar, neste último século: o da separação da Igreja do Estado. Ao contrário do regime anterior, em que a Igreja dominava a monarquia e no qual o catolicismo era assumido como a religião oficial do Estado, na República o princípio dominante é o da separação clara das esferas politica e religiosa. É o triunfo do laicismo, se se quiser, no sentido em que nem a Igreja manda no Estado, nem o Estado manda na Igreja. Há respeito mútuo, mas não subserviência de qualquer das partes, muito menos promiscuidade.
A luta política desenvolvida pela oposição democrática ao fascismo, brandiu frequentemente os valores da República como fundamento das suas propostas e das suas práticas. Não esqueçamos que, nessa época, os oposicionistas comemoravam o 31 de Janeiro e o 5 de Outubro, como símbolos de uma ideia que queriam ver reimplantada no país. O 25 de Abril veio, enfim, dar um novo impulso purificador aos ideais republicanos, re-actualizando-os. O 25 de Abril acabou por relegitimar o 5 de Outubro.
Hoje, um século passado sobre a proclamação da República, há valores republicanos que se mantêm e reforçam. Por exemplo, o fortalecimento do municipalismo, que foi uma das mais sonhadas utopias saídas do 5 de Outubro. O Portugal dos nossos dias é uma “construção” dos municípios, em áreas fundamentais, desde as infra-estruturas básicas à cultura e ao desporto.
Outro exemplo, é o reforço da participação cívica e politica dos cidadãos e, em especial, a emancipação da mulher e consolidação dos seus direitos (no trabalho, na esfera privada, no domínio público). E também a igualdade de oportunidades entre os sexos e no âmbito social. O sentido do progresso e da evolução, aos diferentes níveis.
Igualmente o é a aposta decidida na Educação, como pressuposto para o desenvolvimento económico e para a libertação social. Lembremos que a 1ª República instituiu a instrução obrigatória de 4 anos (que, depois, regrediu para 3 anos, no consulado salazarista, para quem bastava ensinar as crianças a “saber ler, escrever e contar”…) e hoje se investe politicamente na elevação das qualificações dos portugueses.
Princípios republicanos são também o apego ao sistema democrático, o triunfo da cidadania e do civismo, as atitudes de rigor, lisura, integridade e verticalidade nas relações humanas, o respeito pelos direitos sociais e políticos dos portugueses, a tolerância como sistema de vida, enfim, o combate à corrupção, à fraude e a todos os atropelos à dignidade da “coisa pública”.
Por tudo isto, nos parece que a República continua plenamente actual, um século volvido, nos seus pressupostos, nos seus desígnios, na sua prática inovadora. Uma República que não estigmatiza, que não discrimina, que não exclui. Uma República estribada nos sagrados princípios oitocentistas da Liberdade, da Igualdade e da Fraternidade.
Custa muito aos monárquicos aceitar a realidade?

COMÉDIA DE GIL VICENTE NO TEATRO-CINEMA DE FAFE

Uma boa comédia de Gil Vicente, O Pranto de Maria Parda, é o que promete a Filandorra - Teatro do Nordeste para a noite (21h30) deste sábado, 9 de Outubro, no Teatro-Cinema de Fafe.
O texto de Gil Vicente é acrescentado pelo escritor vila-realense A. M. Pires Cabral.
«No livro quinto da Compilação, «que he das trovas &cousas meudas», vêm as «trovas de Gil Vicente em nome de Maria Parda fazendo pranto porque vio as ruas de Lixboa com tam poucos ramos nas tavernas & o vinho tam caro & ella nam podia viver sem elle».
As trovas de Gil Vicente sobre o pranto de Maria Parda constituem uma composição neste género faceto de cancioneiro. Por forma intensamente cómica, consegue Gil Vicente dar-nos um tipo popular de ébria, certamente muito conhecido nas vielas de Lisboa quinhentista. Estas trovas deveriam ter surgido como a condensação das lamentações dos bebarros, nesse ano funesto de vinte e dois, no qual, como no anterior, «por falta de agoa e polla secura do tempo, foy em toda Espanha excessiva a esterilidade».
Tendo visto vaguear pelo escuro das ruelas a figura desgrenhada e andrajosa de Maria Parda, a farejar nos antros das tabernas as exalações ácidas das pipas vazias, Gil Vicente pretendeu tirar da própria dor popular a gargalha do seu remédio.


Ficha técnica:
Autor: Gil Vicente, texto acrescentado de A. M. Pires Cabral
Dramaturgia, Espaço Cénico e Encenação: David Carvalho
Actores: Anita Pizarro, Bibiana Mota, Helena Vital, Bruno Teixeira e Victor Santos
Guarda-Roupa: Helena Leitão
Direcção Técnica: Carlos Carvalho
Luz e Som: Diogo Medeiros
Produção/Recursos Humanos: Cristina Carvalho
Comunicação/Relações Públicas: Silvina Lopes

sábado, 2 de outubro de 2010

FAFE COMEMORA CENTENÁRIO DA REPÚBLICA

Fafe é uma terra de republicanos e de lutadores pela nobre causa da liberdade. Basta atentar, e para não irmos mais longe, no que foi a luta de centenas de operários, activistas e de intelectuais fafenses nos anos negros do fascismo, de triste memória.
Por isso, ao longo dos anos, ainda muito antes do 25 de Abril de 1974, se evocavam as datas primordiais atinentes à proclamação da República, em especial o 31 de Janeiro (de 1891, referente à primeira tentativa de instauração do regime republicano, no Porto) e o 5 de Outubro, como referentes de um combate pelo regime que se pretendia restaurar.
Já depois do "golpe dos capitães", Fafe começou a comemorar condignamente, regularmente, em liberdade, a excelsa data histórica da Proclamação da República, o que faz, assim, por sistema, há mais de três décadas.
Ao contrário de muitos outros municípios que apenas relembram o Centenário da República, por ser data redonda, Fafe evocou ao longo destas décadas a gesta heróica de Machado dos Santos, Bernardino Machado, Afonso Costa, Teófilo Braga e tantos outros.
Por isso, no Centenário, que todos comemoram, Fafe não se coloca em bicos de pés e optou por um programa simbólico e até original, ao chamar à sessão solene de 5 de Outubro, um conjunto de jovens que vão apresentar os resultados do projecto Juventude 2010 - 100 anos - 100 ideias para participar. É a melhor forma celebrativa de uma efeméride de tão elevado significado: voltada para o futuro e não para a mera contemplação histórica.
É, assim, de referir que o município de Fafe volta a evocar a data histórica da Proclamação da República, com um programa comemorativo que se estende pelos dias 4 e 5 de Outubro.
No dia 4 de Outubro, segunda-feira, a partir das 21h30, no Pavilhão Multiusos, realiza-se a tradicional Festa do Desporto, que compreende a entrega do Prémio Desportivo Câmara Municipal de Fafe e do Troféu “Não à Violência-Viva o Desporto”, relativos à época 2009/2010 e que junta habitualmente centenas de desportistas locais.
Dia simbólico, contudo, é o 5 de Outubro, terça-feira, que começa com a habitual alvorada de morteiros pelas 9h00.
Após o hastear da bandeira no edifício dos Paços do Concelho com o desfile da Fanfarra dos Bombeiros Voluntários de Fafe, pelas 10h00, realiza-se no Salão Nobre a habitual sessão solene evocativa da efeméride.
A sessão é aberta pelo Presidente da Assembleia Municipal, Laurentino Dias, seguindo-se a intervenção do Professor Doutor Norberto Cunha, docente jubilado da Universidade do Minho, que vai reflectir sobre a actualidade dos valores da República. Uma mensagem a não perder, dada a qualidade intelectual e científica do orador.
A cerimónia continua com a intervenção da aluna Cláudia Micaela Fernandes Gonçalves, da Escola Secundária de Fafe, relativa à liberdade política e participação cívica, bem como a entrega ao Executivo Camarário do documento final do projecto Juventude 2010 – 100 anos – 100 ideias para participar e a intervenção do representante dos jovens acerca das 100 propostas contidas no documento.
A sessão solene comemorativa é encerrada pelo Presidente da Câmara, José Ribeiro, finalizando com a execução do Hino Nacional pela Academia de Música José Atalaya.

De referir que as comemorações do Centenário da República em Fafe se vão prolongar por mais alguns meses, com diversas iniciativas e edições bibliográficas.
Para já, arranca esta quinta-feira, dia 7 de Outubro, pelas 18h30, na Biblioteca Municipal, o I Curso Livre de História Local, organizado pelo Núcleo de Artes e Letras de Fafe, com o apoio do Município, este ano sobre a temática "O concelho de Fafe na I República".
Seguir-se-ão outras iniciativas, como a edição de obras literárias, exposições e o mais que se verá até Agosto do próximo ano, altura em que se comemora o centenário da primeira Constituição Republicana...