Em 21 de Março, celebrou-se o Dia Mundial da
Poesia, uma criação da UNESCO, datada de 1999, para celebrar a
diversidade do diálogo, a livre criação de ideias através das palavras,
criatividade e inovação. A data visa fazer uma reflexão sobre o poder da
linguagem e do desenvolvimento das habilidades criativas de cada pessoa.
Como tem acontecido ao longo dos últimos 14 anos, a
comemoração serviu para o lançamento de livros, promoção de recitais,
declamação de poesia nos mais diversos e improváveis locais.
Lembra-se, em 21 de Março, uma forma de criação
literária que, nos restantes meses, é praticamente sonegada.
Escrever poesia, publicar poesia, ler poesia são
exercícios de loucura e gratuitidade nestes tempos ominosos de materialismo, de
negócios, de empobrecimento humano, em que os cidadãos estão mais preocupados
com o pão que é necessário para encher as bocas dos filhos do que com os ócios
que preenchem a fome do espírito, mas não servem para nada, afinal.
A poesia está absolutamente desaparecida de combate
quando entramos numa qualquer livraria e apenas lobrigamos romances de Paulo
Coelho, As Cinquenta Sombras de Grey
e suas sequelas, quando muito as últimas obras de Nicholas Sparks, de José
Rodrigues dos Santos ou António Lobo Antunes.
Contam-se pelos dedos as
centenas de pessoas que, pelo país além, escrevem e lêem poesia, apesar de
identitariamente nos considerarem um país de poetas.
Mas de poetas e loucos todos
temos um pouco.
Fica bem ostentar na estante
da sala de jantar um exemplar dos Lusíadas,
ou da Eneida, ou da Mensagem. Como alguém escrevia há
tempos, “ a qualidade de um homem do mundo vê-se hoje tanto pela estante como
pela marca de colónia que fede, e um ou dois livros de poesia ficam bem na
estante de uma pessoa de sucesso”.
Porém, os políticos gostam
de colocar na lapela e decorar os seus discursos com sugestivas citações de
Luís Vaz de Camões, Fernando Pessoa ou Eugénio de Andrade, e tantos outros
poetas portugueses, em função dos seus interesses, ou da sua ignorância e falta
de ideias.
É evidente que não são
capazes de ler e apreciar obras poéticas, de mediana dimensão, porque a maioria
são iletrados. Conhecem, quando muito, folhas de excell ou sabem manejar um Ipad, mas são completamente ignaros do
melhor que um país pode ostentar, que é a sua literatura, a sua poesia, a sua
cultura…
É claro que para os
políticos a cultura está na última fila da ordem de prioridades. Todos se pelam
pela garantia da segurança, pelas funções sociais do Estado, pela Defesa, pela
Agricultura, pela Economia.
Mas ninguém se inquieta com
a poesia, nestes tempos ominosos das troikas, dos cortes, dos défices, das
moções de censura, da inflação desmesurada e violenta de palavras e discursos
que nada acrescentam à alma dos cidadãos, ao seu coração, à sua sensibilidade.
Como escreve um poeta maior
da literatura portuguesa, Manuel Alegre:
“Cada poema que se escreve é uma derrota da
indigência, seja ela cultural, ética, política ou mesmo literária. Uma derrota
da indigência e da regressão civilizacional que hoje estamos a viver.
Nos tempos que correm, cada poema, independentemente
do seu conteúdo, é um acto de resistência. Contra a contaminação da linguagem
por aquilo a que Sophia de Melo Breyner chamou “o capitalismo das palavras”.
Contra a cultura do número e a ocupação da língua por taxas de juro, cotações
bolsistas, troikas e empresas de rating. Contra a violação da nossa liberdade
pela mão invisível. Contra o imediato, o efémero e o mediático. (…)
Entre os muitos défices que avassalam o mundo e
invadem as nossas vidas há um de que não se fala: o défice de poesia. Não será
possível resolver os outros sem que no cinzento de cada dia haja um pouco mais
de azul, um pouco mais de poesia.
A palavra do homem está pervertida. Pela tecnocracia,
pelos interesses, pelo império do dinheiro. A pequena ou grande revolução que
cada poeta pode fazer é subverter o discurso instituído e recuperar a força
mágica da palavra. Porque a poesia é linguagem e só por ela se pode
reconquistar a perdida beleza da palavra do homem.
Talvez seja para isso que servem os poetas em tempo de
indigência. E talvez seja esse o poder da poesia na grande selva em que se
transformou o mundo”.
A reivindicação que há que fazer é que a poesia
ilumine as nossas vidas, como porventura a religião e a filosofia.
São dimensões espirituais que humanizam o homem e o
tornam melhor, mais perfeito, mais belo, mais nobre.
Poesia todos os dias!
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