“Tudo É e
Não É” é o título do novo romance de Manuel Alegre, lançado há escassos meses.
O protagonista, António Valadares, é escritor e vive
submerso num sonho obsessivo e recorrente, de onde não há fuga possível. Numa
derradeira tentativa de encontrar um sentido naquilo que não o tem, aventura-se
a escrever sobre a sua vida onírica. Tem assim início uma viagem a um mundo
repleto de situações ilógicas e incontroláveis, de intrigas e contradições; um
mundo onde personagens reais e fictícias convivem e se fundem.
O que António Valadares não prevê é que o seu empenho em narrar o inenarrável o aprisionará num caleidoscópio de sonhos e obsessões onde realidade e sonho, sonho e ficção já não se distinguem, e em que o próprio espaço e tempo são subvertidos, desde a discussão com Lenine e Trotsky em plena revolução russa até às manifestações em Lisboa e à Mão Invisível que invade a vida e o sonho.
O que António Valadares não prevê é que o seu empenho em narrar o inenarrável o aprisionará num caleidoscópio de sonhos e obsessões onde realidade e sonho, sonho e ficção já não se distinguem, e em que o próprio espaço e tempo são subvertidos, desde a discussão com Lenine e Trotsky em plena revolução russa até às manifestações em Lisboa e à Mão Invisível que invade a vida e o sonho.
João Maria André, filósofo e
Professor catedrático na Faculdade de Letras de Coimbra, na apresentação do
romance na Casa da Escrita, naquela cidade, afirmou estarmos perante um livro
que acaba por ser uma “vingança dos sonhos ou o reverso de Descartes”. Isto
porque, apesar de se tratar de ficção, é uma obra que a partir do dispositivo
dos sonhos e da sua interacção com a realidade e com a escrita, subverte a
lógica binária cartesiana.
Assim, “Tudo É e Não É”, logo no título, é, de facto, “uma vingança dos sonhos”
e “um retorno da sua lógica copulativa e coincidencial, não apenas no registo
dos sonhos, mas também no registo da realidade.”
Diz o protagonista: “Sonho
sempre. Tenho a sensação de que quando deixar de sonhar, morrerei”.
E acrescenta, noutra altura:
“Um sonho é feito de muitos sonhos. E há sonhos que se cruzam no sonho de que
não consigo libertar-me”.
Ou então: “muitos sonhos e um
só sonho. Ou sempre o mesmo dentro de outros sonhos”
E continua, citando
Shakespeare: “somos feitos da mesma matéria de que são feitos os sonhos”.
Mais tarde dirá que “também
somos o mistério que os sonhos são”.
Nesse sonho, ou nessa ficção,
entram personagens vivas do mundo real e outras pertencentes à memória
colectiva.
Entra também, de alguma forma,
o alter-ego do autor, os seus sonhos, anseios, o seu passado: um homem de
esquerda, que andou pela guerra colonial, esteve num lugar simbólico como
Nambuangongo, é amante da caça, das letras e da boa mesa, crítico feroz dos
mercados, das agências de rating, do “estádio supremo do capitalismo”, dos
especuladores e dos “poderes ilegítimos que se sobrepõem, à democracia e à
própria soberania dos Estados”.
Este é, sem dúvida, Manuel
Alegre, através do protagonista da obra, António Valadares.
Um protagonista que cita
músicos, escritores, homens do cinema e poetas como José Régio, Paul Valéry
Whitman, Dante, António Ramos Rosa. E outras suas mitologias.
Trata-se de um romance
estranho, no âmbito da obra de Manuel Alegre. Um texto mais intimista, algo
estranho e desordenado.
Diz o protagonista:
“perguntam-me qual é o fio condutor da narrativa. Não há. Nem na vida, quanto
mais no sonho”.
E diz ainda: “tenho-me
empenhado na tentativa de narrar o inenarrável: o sonho que vem e se esfuma…”.
Enfim, “a libertação de
obsessões por meio da escrita”, como escreve em outro passo.
Mas um romance onde a alma
poética de Manuel Alegre espreita a cada passo.
Numa escrita muito pessoal, Manuel Alegre regressa ao
romance com uma história inquietante e surpreendente. Um “romance veloz, ágil,
voraz” – como o classifica a escritora Maria Teresa Horta. Um romance que se lê
com inteiro agrado.
Boas leituras!
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