1. Nos últimos dias, insistentemente, os media têm-se divertido com matérias para entreter o pagode, como convém. Chamar a maçonaria às parangonas, como tem sido feito, até à paranóia, não faz qualquer sentido. A maçonaria, hoje em dia, não faz a mínima mossa, não tem relevância de maior.
Descobriu-se, de súbito, que há uma coisa alarmante chamada maçonaria, que parece corporizar um bando de malfeitores cujo intento é conquistar o aparelho de Estado, ocupar o poder e encher os bolsos. Ora, que se saiba, estas pretensões podem perfeitamente adaptar-se a outras áreas, que não são secretas, nem sequer discretas, e que passam pelos partidos, pelos clubes de interesses, ou pelos lóbis. E porque não pela Opus Dei, da qual parece não haver interesse em falar, mas deverá ser ainda mais assustadora. E a maçonaria, para quem analisar seriamente, está historicamente identificada com os valores da liberdade, da igualdade, da fraternidade, da rectidão, do aperfeiçoamento tendo em vista uma sociedade melhor.
Levantar hoje, a questão da maçonaria é claramente ressuscitar contenciosos que tiveram o seu tempo no Estado Novo (em que foi proibida por Salazar) e que o 25 de Abril ultrapassou. Porque, com a Revolução, os cidadãos adquiriram o direito a professar crenças ou convicções de acordo com a sua consciência e valores, sem que alguém tenha a ver com isso: o Estado, os jornalistas ou os outros cidadãos.
A insistência na questão da maçonaria está a ser claramente uma manobra de diversão e manipulação dos media e dos políticos, para desviar a atenção do que realmente importa.
2. E o que importa é saber quem anda a mentir aos portugueses: se o governo, que passa a vida a anunciar medidas de austeridade às pinguinhas, e nos promete um 2013 já em desaceleração da crise, ou o Banco de Portugal que prevê já para este ano uma recessão ao nível da pior expectativa do executivo e para o próximo ano “mais austeridade, maior recessão e menos emprego”. Alguém anda a ludibriar as expectativas dos cidadãos, permanentemente aturdidos por mensagens em que já não acreditam.
O que interessa é lamentar que um secretário de Estado, no caso o do Emprego, Pedro Silva Martins, tenha autorizado a Soares da Costa a despedir cerca de mil trabalhadores.
Este é que é um assunto desgraçadamente de tomo, não a maçonaria.
3. O que importa é lastimar a discrepância entre as promessas de Pedro Passos Coelho e a realidade da ocupação do aparelho de Estado pelo pessoal político dos partidos do Governo.
Não que essa não seja uma prática normal, e até legítima dos sucessivos governos, mas descredibiliza um político que ainda há menos de um ano afirmava peremptoriamente que, com ele, os lugares do Estado e das empresas participadas seriam ocupados por competências e não por cartões de militantes, ou pelo “amiguismo”. Ora, o que se verifica? Tudo contradiz o que antes se sustentava!...
O que interessa é reiterar a vergonha de uma empresa monopolista, como a EDP, que suga até ao tutano os portugueses, incluir no seu conselho de supervisão apenas “competências políticas”, como os iluminados Eduardo Catroga, Celeste Cardona, Paulo Teixeira Pinto, Braga de Macedo e Rocha Vieira, entre outros, com Catroga (o negociador com a tróica por parte do PSD, não se esqueça) a auferir um salário pornográfico de 639 000 euros/ano, a que, presumivelmente, se soma uma pensão mensal a rondar os 10 000 euros. Quando tantos portugueses já passam forme, quando há mais de 750 mil desempregados, quando os portugueses em geral estão a empobrecer rapidamente, não tem um outro nome se não um escândalo o que se está a passar na EDP (que não é tão privada e independente como isso!...).
Catroga é a rosto do escândalo: e ainda tem a supina lata de declarar que, se a lei permitir, acumula o ordenado obsceno com a pensão milionária.
Onde anda o tal Passos Coelho, que prometeu (e não cumpriu) limitar as “pensões douradas”? Muita treta pré-eleitoral, como sempre!...
Para já não falar das nomeações escandalosas para as Águas de Portugal, que são bem o panorama do que é hoje o estado do clientelismo em Portugal!...
4. O que importa, também, é deplorar que grandes accionistas de empresas portuguesas, no caso concreto, a Jerónimo Martins, emigrem as respectivas sedes para a Holanda com o único fito de pagar menos impostos. “Sabe bem pagar tão pouco…”.
Numa altura em que tantos enchem a boca de solidariedade, da necessidade de “união nacional” para enfrentar a crise, de atitudes positivas e patrióticas para avançarmos em frente, não deixa de ser caricato e paradoxal que se teçam aqueles caminhos.
5. O que importa é denunciar a desfaçatez, a falta de sensibilidade e a pesporrência de uma senhora (?) chamada Manuela Ferreira Leite que teve o descaramento de afirmar em público que «quem tem mais de 70 anos e quer fazer hemodiálise tem de pagar». Francamente: nem um coração de pedra diria tal alarvidade. Mas sabendo-se quem afirmou há tempos que era necessário suspender a democracia por meio ano, já nada admira. Só pode ser senilidade!
Estes são assuntos bem mais importantes, candentes e ponderosos que as questões menores da maçonaria e outros amendoins!
6. Por estas e por outras, é que não consigo acreditar, nem um pouco, nesta gente, que se governa e nos desgoverna!
Não consigo confiar neste Portugal, que se lhe há-de fazer?!...
(Texto publicado, com ligeiras alterações, no Povo de Fafe, de sexta-feira, 13 de Janeiro e no Correio do Minho, desta segunda-feira, 16 de Janeiro)
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