terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Relembrando o 31 de Janeiro de 1891: primeiro momento de uma República hoje violentada

Passa hoje mais um aniversário (121 anos) do 31 de Janeiro de 1891, considerado pela historiografia como o primeiro grande momento da luta contra a monarquia e a favor da instauração da República, essa feliz realidade e regime que nos rege, mas que os actuais governantes vilipendiam, autênticos mercenários da História e roubadores do passado colectivo.

Nesse dia, a bandeira republicana esteve hasteada durante algumas horas no coração do Porto, por acção de um punhado de corajosos lutadores que se envergonhariam até ao nojo dos Álvaros, dos Passos e dos Gaspares que em 2012 cuspiriam na memória dos que se sacrificaram em prol de um Portugal mais livre, solidário e independente, ao contrário do vómito em que o transformaram!...

O 31 de Janeiro surge como reacção ao célebre Ultimato inglês de 11 de Janeiro de 1890.

Nesse dia, a Inglaterra enviou ao rei D. Carlos um ultimato: ou os Portugueses desocupavam os territórios situados entre Angola e Moçambique ou o governo inglês declarava guerra a Portugal.

O Governo viu-se obrigado a aceitar o Ultimato, o que provocou manifestações de descontentamento, protestos e greves. Em 14 de Janeiro de 1890, o Partido Republicano Português organizou uma grande manifestação em Lisboa, acusando o rei D. Carlos e o Governo de terem traído os interesses dos Portugueses em África.

É nessa onda de descontentamento que surge o hino militar chamado “A Portuguesa”, exaltando as glórias do passado e incentivando a resistência contra os ingleses. Foi composto pelo músico Alfredo Keil que pediu ao poeta Henrique Lopes de Mendonça que escrevesse uma letra que desse voz à revolta que grassava pelas ruas.

A música começou a ser cantada por todo o lado, nos cafés, nas ruas, nos clubes. Era a música de todos os descontentes. Foi proibida pelo governo, mas continuou a ser cantada às escondidas.

A partir de 1910, passou a ser o hino nacional, até hoje!... Com esta gente que corta ordenados e elimina feriados, será até quando?

Qualquer dia, trocam o hino nacional por qualquer cantiga do Emanuel ou do Tony Carreira. Já esgotei a minha capacidade de surpresa, no último meio ano!...

O movimento revolucionário de 1891, disse um dos seus protagonistas mais conhecidos, João Chagas (futuro chefe de um governo republicano), de que se falará abaixo, pôs “definitivamente a soberania popular em face da velha soberania régia, separando-as completamente e tornando público esse divórcio.” “A revolução do Porto feriu de morte a Monarquia que nunca mais teve um momento de repouso. A partir de então, deixou de haver em Portugal uma forma de governo estável, mas um conflito permanente entre as duas soberanias.”

Relembramos a seguir um texto publicado por Pedro Olavo Simões no JN de 24 de Janeiro de 2010, já lá vão dois anos, no âmbito das comemorações do centenário da República, que naquela altura faziam sentido e cujo amesquinhamento pelos sujeitos que ocupam temporariamente as cadeiras de S. Bento nos faz corar de vergonha.

O autor faz avultar a acção dos sargentos no deflagrar do 31 de Janeiro, uma das datas mais emblemáticas do Portugal Contemporâneo, para quem respeita a História Pátria, o que, desafortunadamente, hoje em dia até parece um pecado!...

 

“Tem por aqui sido dito, e é consabido, que o 31 de Janeiro de 1891 foi, em boa medida, a revolta dos sargentos. "A sargentada do Porto", dizia-se nos círculos republicanos portuenses. Mas são esses homens, movidos por razões de ordem variada, os mais esquecidos.
Além do sargento Abílio de Jesus, cuja memória perdura pelo simbolismo de ter sido o primeiro militar a bradar "Viva a República!" - quem lá estava bem viu -, eram oficiais os militares mais recordados como participantes na revolta republicana portuense - o capitão Leitão, o tenente Coelho, o alferes Malheiro. Mas são sempre os mesmos três, nenhum deles de alta patente. Dos sargentos e das praças pouco se conta.
Nessa classe militar, o descontentamento vinha de longe. Através do jornal "O Sargento", já em 1889 eram publicadas notícias das queixas destes militares, relacionadas, no essencial, com remunerações e com promoções. Mas, no dia 17 de Janeiro de 1891, a gota de água que agitou a já transbordante taça foi a promoção a alferes, pelo Exército, de três aspirantes, quando a lei obrigava a que esses postos fossem destinados a dois aspirantes e um primeiro-sargento. O Governo era liderado, ao tempo, por João Crisóstomo, que foi alvo de duras críticas no referido órgão da classe. "Quando o sr. João Chrysostomo subiu ao poder, nós sabíamos já perfeitamente com o que havíamos de contar. Mas ainda havia no exército quem confiasse n'aquelle senhor", lia-se no artigo, que, mais adiante, assumia um bem maior peso político: "Os campos estão hoje bem delimitados: de um lado a situação que o governo representa, do outro lado o exercito e a nação: de um lado uma soberania falsa com uma força só apparente, do outro lado a soberania nacional com a verdadeira força; de um lado o passado que se fortifica para resistir, do outro lado o futuro que concentra e mobilisa as forças para destruir".
Por essa mesma altura, como relatam João Chagas e o tenente Coelho, em "História da Revolta do Porto" (1901), os sargentos da Invicta emitiam um comunicado muito esclarecedor, igualmente publicado em "O Sargento". "Basta de escarneo, impudentes estadistas. Não brinqueis com o fogo que elle pode incinerar-vos!", escreviam, insistindo no tom ameaçador: "Tomemos as armas nas mãos: e com fé e enthusiasmo saudemos o futuro, que elle minorará a nossa sorte ingrata".
Do papel que os conspiradores civis tiveram, chamando os sargentos para a causa republicana, já por aqui temos falado. A gente de "A Republica Portugueza", com João Chagas à cabeça. Bem como da acção decisiva de Santos Cardoso, o malquisto redactor e proprietário de "A Justiça Portugueza", que promoveu reuniões na sua própria casa, e noutros locais, que ajudaram a impulsionar a revolta.
Naturalmente, a ideia de que a revolta foi uma "sargentada" não faz grande sentido, devido ao forte cunho político imprimido à revolta pelos responsáveis civis. Mas é entendido como certo que foi a adesão dos sargentos, espontânea, convicta e sentida pelos próprios como urgente, que precipitou os acontecimentos de que aqui nos ocupamos.
Estar aqui a enumerar nomes de sargentos – seria fácil, lendo-os nas listas dos conselhos de guerra - de nada serve. Contrariamente aos três oficiais envolvidos na revolta, movidos pela convicção de que a mudança de regime era premente, os sargentos actuaram como um corpo. Muitos teriam ideias republicanas, todos viviam um profundo descontentamento de classe (…). 

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