1. Quando se aproximam as autárquicas
de 2013, começam a aflorar candidaturas, anunciadas com retumbância, ainda que inequivocamente
à margem da actual legislação eleitoral. É o caso de Luís Filipe Menezes que, acabada
a possibilidade legal de se recandidatar, pretende ser “recompensado” pelos
“buracos” que deixou em Gaia com a titularidade da autarquia do outro lado do
Douro, que tem feito gala exactamente na recuperação financeira. Isto, obviamente,
se chegar a formalizar a candidatura, se esta for aceite pelos tribunais e se o
eleitorado da segunda maior cidade do país for na cantiga!
Em
causa está a violação da famigerada Lei n.º 46/2005, de 29 de Agosto, do tempo
de José Sócrates, que estabelece “limites
à renovação sucessiva de mandatos dos presidentes dos órgãos executivos das
autarquias locais”, uma matéria que há anos vinha a ser debatida no espaço
político, sem solução. Desde logo, porque alguns a consideravam
“antidemocrática”, pelo facto de um diploma legal se substituir à alegada soberania
do eleitorado. O que estava em causa era saber-se: a) devem os líderes das
autarquias ter os mandatos limitados por lei, independentemente da sua vontade,
visando a saudável renovação do “pessoal político” e evitando assim a
eternização dos mesmos no poder, ou b) deve outorgar-se às populações o poder
de decidirem, eleitoralmente, de quatro em quatro anos, se devem ou não renovar
a confiança aos “dinossauros” do Poder Local, sem olhar aos anos de governação?
Mas essa não era nem é a única questão em jogo.
Nos termos daquele diploma, que entrou em vigor em 1
de Janeiro seguinte, “o
presidente de câmara municipal e o presidente de junta de freguesia só podem
ser eleitos para três mandatos consecutivos, salvo se no momento da entrada em
vigor da presente lei tiverem cumprido ou estiverem a cumprir, pelo menos, o 3º
mandato consecutivo, circunstância em que poderão ser eleitos para mais um
mandato consecutivo”. Mais se estabelecia que aqueles autarcas, “depois de
concluídos os mandatos referidos, não podem assumir aquelas funções durante o
quadriénio imediatamente subsequente ao último mandato consecutivo permitido”.
Este
é o articulado ainda em vigor e que é absolutamente claro: os autarcas que
tenham atingido o terceiro mandato consecutivo, não podem candidatar-se no
mandato seguinte.
Absolutamente
claro, mas o chico-espertismo sobretudo
do PSD está a esforçar-se por contornar a lei, para que Menezes (PSD) se possa
candidatar ao Porto… Pelos vistos, e segundo o Expresso do último sábado, o PS
já não alinha nessa vigarice. Só lhe fica bem!...
Quando
os interesses partidários se sobrepõem ao respeito pela legalidade e pelo
“espírito do legislador”, algo está errado, e contribui para o desprestígio das
instituições e para denegrir ainda mais a péssima imagem que já está
consolidada da classe política. Porque o que a lei visa é a saudável renovação
dos titulares dos cargos políticos a nível autárquico, o que nem sempre agrada
aos aparelhos partidários, com outra lógica de interesses.
Mas
não custa a admitir que a união de esforços dos “interessados”, no Parlamento,
consiga “clarificar” a possibilidade de um autarca que já tenha esgotado os
seus mandatos num concelho possa apresentar-se a votos num município ao lado. O
CDS é contra, entendendo (e bem) que após os três mandatos definidos na lei um
presidente de câmara não deve poder candidatar-se num outro concelho.
Desvirtuar
este princípio é manifestamente “driblar” a lei.
Mas quando o insuspeito ministro
Miguel Relvas se arroga o direito de interpretar o «espírito do legislador» e
decreta que «esta reforma quando foi feita, foi sempre (no sentido de) que a
limitação seria sobre o território e não sobre a função», está tudo dito do que
há a esperar!...
Pode vir a ser uma interpretação
correcta da lei; pode vir a ser legal, porque a lei se molda e ajusta ao que
dela se pretende, para manter o domínio. Mas não deixa de ser uma vergonha e
uma indecência, que deveria fazer corar quem tem algum pingo de respeito pela
ética e pela moral na política, o que, desafortunadamente, vai sendo mais
difícil de encontrar do que candidatos a mudar de município, para tentar a
perpetuação no poder!...
2. O mesmo raciocínio se aplica,
obviamente, às novas unidades territoriais saídas da reforma administrativa
autárquica. Quer dizer, os agrupamentos ou uniões de freguesias. Um autarca que
esgotou três ou mais mandatos, deveria estar impedido de se candidatar a outra
freguesia ou a uma “união de freguesias”. Mas já se ouvem uns zunzuns em
sentido contrário. O que francamente se lamenta, pelas razões aduzidas…
3. Questão diferente é saber se é justo e
razoável que a lei de limitação de mandatos se aplique apenas à parte mais
frágil do corpo político do país, os autarcas, deixando de fora os deputados,
os ministros e os chefes dos governos regionais, dado que o presidente da
República sempre esteve limitado a dois mandatos. E não é justo, nem razoável
que um presidente de câmara ou de junta apenas possa exercer os seus mandatos
durante 12 anos e um deputado o possa fazer durante décadas seguidas.
Mas, como
diz o povo, quem manda (quer dizer, legisla) pode!... Ou não!...
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