Tudo indica, a crer nas sondagens e estudos de opinião que têm saído nos últimos dias, que Cavaco Silva vai ser entronizado como Presidente da República nas eleições do próximo domingo, cumprindo o seu segundo mandato.
Cavaco: que se julga acima de qualquer suspeita, como se pairasse no etéreo, sem necessidade ou dever de fornecer informações ou explicações sobre o que faz ou deixa de fazer. E em democracia, não há “bezerros de ouro”, divinos, mitológicos, intangíveis. Os políticos, neste caso, na sua mais elevada expressão, são e devem ser escrutinados, até à última dúvida. A sua vida só pode ser limpa, nítida, cristalina.
Por isso se lamenta a arrogância de Cavaco face a interrogações sobre as suas ligações ao BPN, designadamente à venda de milhares de acções, que resultaram num elevado “encaixe financeiro”, em virtude da sua amizade e cumplicidade com o vígaro maior do BPN, Oliveira e Costa.
Como se lastima a sobranceria de Cavaco quando se recusa a responder a perguntas que lhe dizem directamente respeito, como a que se relaciona com a polémica permuta da sua casa do Algarve.
A sua insolência quando se atreve a afirmar que há-de nascer o português que seja duas vezes mais honesto que ele próprio e que “de desonestidade já chega”. Claro que é suficiente tamanha sobrançaria!
E, cúmulo dos cúmulos, quando esta quinta-feira vem afirmar que uma segunda volta das eleições presidenciais representaria um agravamento das condições de vida dos portugueses e uma subida dos juros da dívida. Esta afirmação é inconcebível, inqualificável, inadmissível.
Chantagem pura, de um democrata de fresca data, um cristão-novo da democracia que jurou fidelidade ao salazarismo, in illo tempore e que nunca ostentou, como primeiro-ministro (10 anos) e presidente da República (5 anos), o vermelho dos cravos da liberdade.
Tem sido um infeliz nas suas posições e declarações, Aníbal Cavaco Silva.
Quanto à esquerda, nestas eleições, mais uma vez, surge dividida (quatro candidatos) e sem rumo, para gáudio da direita, congregada em torno do seu líder natural.
O mais forte candidato de esquerda à presidência é, sem dúvida, Manuel Alegre. Apresentou ideias interessantes, foi combativo, mobilizador, mas pregou no deserto.
Altíssimo poeta e escritor, político controverso, deputado socialista que passou os últimos anos a criticar as medidas do PS, pagou caro a sua anterior dissidência.
Alegre, que José Sócrates não suporta (como não suporta Soares, como não suporta ninguém, a não ser a si próprio), ficou sozinho nesta campanha. Foi claro e ruidoso o deserto de empenhamento do PS nestas eleições. Um apoio envergonhado, que não dignifica ninguém: se o PS não queria Alegre, não o apoiava. Se o quis apoiar formalmente, tinha de se empenhar até às últimas consequências, com todas as suas figuras e todos os seus recursos, até por disciplina partidária. Não aconteceu isso e cada um fez o que quis, ou não quis.
Alegre foi um candidato refém de um equívoco ideológico: apoiado por dois partidos diametralmente opostos, adoptou um discurso difuso para agradar a ambos, o que não deu grande coisa.
Criticou o governo, quando conveio e não fazia grande mossa. Apostou na defesa e garantia do “Estado Social”, quando todos sabemos que está a ser destruído por José Sócrates, na educação, na saúde, na segurança social, no apoio aos mais pobres e desprotegidos.
Um discurso contraditório que acabaria por não ser atractivo nem sensibilizador.
Mais uma nota: Mário Soares vingou-se de Alegre e inventou Fernando Nobre, que vai fazer alguma mossa nos socialistas e revelar o peso de Soares no eleitorado.
De resto, fica para a história destas eleições a indiferença dos eleitores, a apatia, o imobilismo e a mais que certa vitória da abstenção, em termos finais. Mas não é essa que conta, como se sabe. Valem os votos expressos, e não a opinião de quem fica em casa…
Cavaco vai triunfar. Naturalmente: nunca, depois do 25 de Abril, um Presidente da República sucumbiu ao fim do primeiro mandato. Ramalho Eanes, Mário Soares e Jorge Sampaio completaram dois mandatos consecutivos. Tem sido a ordem natural das coisas.
Os políticos são o espelho do país. O país não merece melhores políticos.
1 comentário:
É a democracia. Parabéns ao Prof. Aníbal Cavaco Silva!
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