1. Como
milhares de outros trabalhadores, com elevado sentido “patriótico”, tive a coragem de participar
na greve geral (ou nem por isso...) desta quarta-feira, que colocou o país a funcionar a meio gás,
paralisando em grande parte os transportes, as escolas, hospitais, autarquias e
outros serviços. Aliás, o protesto foi europeu, convocado pela Confederação
Europeia de Sindicatos, com manifestações em duas dezenas de países da União
Europeia e paralisações gerais em Espanha, na Grécia, em Chipre e em Malta.
Aderi à greve porque, num momento extraordinariamente
difícil da nossa vida colectiva, entendi contribuir com “um dia de salário para
a Nação”. Fiquei sem ele no meu bolso e a minha entidade patronal poupou assim
um dia de ordenado, contribuindo deste modo para o esforço de contenção da
despesa pública.
Se Paulo Portas, há uns dias, não quis sair do governo
alegando “razões patrióticas”, eu também tenho o direito de fazer o mesmo,
negando-me a trabalhar por um dia (excepção feita a esta crónica, ainda que
tenha pensado seriamente entrar em greve também ao computador e deixar em
branco a “Escrita” desta semana, mas o dever falou mais alto, bem como a
extrema consideração pelo director e pelos leitores), para que haja mais
dinheiro nos cofres do erário público. E bem de maquias estão necessitados…
A greve desta quarta-feira só pode ter sido levada a
cabo por “razões patrióticas”.
Porque nas suas motivações esteve protestar contra a bárbara
política de austeridade do governo e da tróica,
de que aquele é zeloso feitor, concretizada no saque constante nos salários e
nos subsídios, no aumento da carga fiscal, no congelamento dos ordenados e das
promoções, na redução do valor do trabalho, nos despedimentos de 50% dos
trabalhadores contratados nas autarquias e de 2% dos trabalhadores dos quadros
(para quem assegurava que na função pública não há despedimentos, até que não
está mal…), na privatização dos serviços públicos e de empresas estruturantes,
na destruição do poder local (extinção de freguesias e outros ataques), no aumento
da idade de reforma. Enfim, no empobrecimento progressivo dos portugueses em
geral, na desqualificação do factor trabalho da economia (ao contrário do
capital, que permanece quase intocável, nos seus paradigmas essenciais), na
insegurança e indefinição quanto ao presente e ao futuro.
Em causa está o ataque do sistema financeiro e da
agenda política europeia ao Estado Social, não apenas português mas europeu que,
queiram ou não os seus detractores, esteve na base da manutenção da democracia
e da paz no continente.
Em Portugal, é uma personalidade insuspeita como o
professor Adriano Moreira a proclamar que “o Estado Social, hoje, está a ser
posto em causa”, declarando ainda que “o que está a acontecer, com a orientação
que Angela Merkel professa, é atirar a esperança pela janela. Nunca vi uma
situação tão severa na vida portuguesa, como hoje”. E do alto da experiência de
90 anos e do seu estudo de décadas sobre a realidade portuguesa, o conceituado
professor reitera que o país se encontra “em regime de protectorado” é conclui:
“é uma injustiça que o povo português seja chamado a pagar a dívida chamada
soberana, mas depois tenha de pagar a dívida municipal, a dívida das concessões
que o Estado fez, a dívida da casa e, depois, esteja despedido”.
Por estas razões, altamente patrióticas e nacionais, a
greve de quarta-feira fez todo o sentido. Os portugueses têm de mostrar a quem
os (des)governa que não estão dispostos a ser escravos, para que Passos Coelho
se ufane do seu papel de subserviente “bom aluno” da chanceler alemã.
Alemanha que lucra imenso com as dificuldades
portuguesas, mais de um milhão de euros por dia, como refere o Correio da Manhã
da passada terça-feira. Grande “amiga”, essa Merkel!...
2. Andam
as águas agitadas para o lado da Isabel Jonet, presidente do Banco Alimentar
contra a Fome e da Federação Europeia dos Bancos Alimentares. Mas não se
percebem as razões, a não ser pelo clima de nervosismo e de exaltação que
campeia neste momento. Porque o que a senhora referiu, em entrevista, não é nada
mais do que o que diariamente ouvimos nos meios políticos e até nas conversas
familiares. Que é necessário “reaprender a viver mais pobres”, dadas as
circunstâncias económicas do país, que há necessidade de contenção de despesas,
que “se não temos dinheiro para comer bifes todos os dias, não podemos comer
bifes todos os dias”.
Mas onde está a infâmia destas declarações que levam
alguns dos críticos a falar em “lavar o sangue que lhe escorre das mãos”!...
Anda tudo louco, meu Deus!
E o tempo e voluntarismo que Isabel Jonet tem dedicado
ao Banco Alimentar não conta para nada?
É óbvio que não. É mais fácil e mediático criticar
umas declarações que poderão ser infelizes, mas que não saem do paradigma da
normalidade, do que fazer algo de positivo pela sociedade!... Não consta que os
acerbos críticos da senhora tenham a sua obra meritória em favor dos mais
desprotegidos!...
(In Povo de Fafe, 16/11/2012)
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