Tive a honra de assistir, esta semana, no Museu Bernardino Machado, em Vila Nova de Famalicão, a uma sessão cultural em torno do tema “as mulheres na implantação da República em Portugal”.
A sessão foi organizada pelo município famalicense, pelo Museu Bernardino Machado, onde pontifica o coordenador científico Professor Doutor Norberto Cunha, inestimável amigo e orientador da minha dissertação de mestrado há uma década, e pela Associação para a Defesa e Promoção dos Direitos dos Cidadãos, Civitas Braga.
A sessão começou, simbolicamente, com a plantação de um carvalho, no parque de Sinçães, entre o espaço da Biblioteca Municipal, dedicada ao imorredouro Camilo Castelo Branco e a Casa das Artes, local de grandes espectáculos nos últimos anos.
O meu amigo Dr. Amadeu Gonçalves, que trabalha cientificamente no Museu dedicado àquele que foi chefe do governo na I República, por três vezes e Presidente da República Portuguesa, por duas vezes (1914 e 1925), explica a simbologia do carvalho, em três momentos distintos mas convergentes:
“- a relação do carvalho com os druidas, que significava sabedoria e força; com a república francesa de 1848, na qual foram plantadas milhares de árvores pelas mulheres, e, finalmente, a relação da árvore com a República, em cujos actos comemorativos as mulheres plantavam o carvalho como símbolo de liberdade, sabedoria e força”.
A sessão continuou com a apresentação da obra As mulheres na Implantação da República, da consagrada escritora e investigadora Fina D’Armada, pela docente e mestre em História Contemporânea Adília Fernandes, investigadora da Universidade do Minho e da Universidade do Porto. Considerou ela que o livro é um hino às mulheres comuns, num tempo em que quem dominava eram os homens. É a exaltação da participação das mulheres na implantação do novo regime que, apesar das promessas, acabou por não lhes conceder os direitos que prometera nos seus programas.
A autora da obra, Fina D’Armada, dissertou depois longamente sobre a temática do seu livro, sob a epígrafe “As mulheres na República”.
Percorrendo diacronicamente o período que vai de 1891 a 1926, a historiadora que já publicou 1021 artigos em 28 periódicos e tem editadas 10 obras individuais e 31 em co-autoria, sobretudo com Joaquim Fernandes, começa por aludir às mulheres do povo (são essas que lhe interessam…) que participam no 31 de Janeiro, algumas das quais baleadas e mortas, bem como às testemunhas dos prisioneiros dessa República antecipada. Aborda depois as republicanas anteriores ao 5 de Outubro, entre as quais a professora Carolina Michaëlis, bem como a criação da Liga Republicana das Mulheres Portuguesas e a acção das socialistas na implantação do Dia Internacional da Mulher.
Fina D’Armada relata, de seguida, a intervenção das mulheres na implantação da República, em 5 de Outubro, aludindo à acção de personagens de republicanas conhecidas como a médica Adelaide Cabete, a jornalista e escritora Angelina Vidal, a escritora Ana de Castro Osório ou a médica Carolina Beatriz Ângelo, a primeira e única mulher a conseguir votar, em 28 de Maio de 1911. E em toda a Primeira República…
Fina D’Armada investigou imensos jornais pelo país, entre os quais o nosso O Desforço entre 1907 e 1910, que cita por diversas vezes.
Entre as mais de duas centenas de republicanas que cita na sua obra, referência para duas mulheres fafenses dessa época: Rosa Maria Nogueira de Araújo, professora oficial da vila de Fafe, que contribuiu com 500 reis para as vítimas da revolução e Laura Soares Summavielle, esposa do Dr. José Summavielle, que proclamou a República em Fafe, em 9 de Outubro de 1910. De Laura Soares Summavielle falaremos depois.
Da obra As mulheres na Implantação da República dir-se-à que é extremamente interessante, para quem gosta destas coisas, naturalmente, com uma imensa teia investigativa, muita informação e dados sobre mulheres que “encheram” o ideário e a prática republicana. São mais de 330 páginas felizes, editadas pela Ésquilo e que abrem com um prefácio de Elza Pais, Secretária de Estado da Igualdade, que cita, em epígrafe, uma frase emblemática de Ana de Castro Osório:
“Eu (…) quero a República como libertação e felicidade para as Mulheres, visto que a humanidade é composta dum só grupo de animais, indiferentemente masculinos e femininos”.
A sessão comemorativa prosseguiu com o depoimento de um grande famalicense e seguidor deste meu blogue, o que muito me honra e desvanece, o Dr. Manuel Sá Marques, neto de Bernardino Machado e da sua mulher Elzira Dantas Machado e filho de Rita Dantas Machado (o último do lado direito, na foto incluída neste post), que deu testemunho da acção dos seus familiares directos no contexto anterior à proclamação do novo regime e na sua consolidação e apogeu.
Elzira Dantas Machado (esposa de Bernardino Machado e mãe de sete dos seus filhos) e Rita Dantas Machado (sua filha) seriam depois objecto de uma homenagem, dado o seu papel de destacadas activistas da Liga Republicana das Mulheres Portuguesas e dos Direitos das Mulheres.
A sessão culminaria com um momento musical pelos alunos da Fundação Castro Alves/ARTAVE.
Um evento marcante a assinalar notáveis personagens da I República em Portugal, neste ano festivo do centenário da sua proclamação.
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