1. Centenas de professores contratados manifestaram-se este sábado, no
Porto (e três dias antes em Lisboa), em protesto contra a obrigatoriedade de
realização de uma prova de ingresso na carreira docente, “inventada” por Nuno
Crato, com o mero propósito de eliminar professores e candidatos a professores,
numa rasteira lógica economicista, que não tem minimamente em consideração as
pessoas envolvidas e põe em causa a credibilidade das instituições de ensino
superior deste país.
Segundo é do
domínio público, a prova é destinada aos professores não integrados na carreira
docente, ou seja, aos contratados. Terá uma periodicidade anual e o seu alegado
objectivo será "aumentar sustentadamente os padrões de qualidade do
ensino", assim como a "equidade entre os candidatos ao exercício de
funções docentes", de acordo com o Ministério da Educação e Ciência.
Obviamente
que estamos no domínio da treta e da mais pura demagogia, mesmo para quem
perspectiva esta matéria como observador. Os padrões de qualidade do ensino não
aumentam apenas pela acção dos professores, como até Nuno Crato, o
propagandista e actual utilizador do “eduquês”, sabe e deverá reconhecer. E se
tal fosse verdade, teriam que ser todos os professores a submeter-se à
famigerada prova. E não é o que vai acontecer, e muito bem. Não deveria é
suceder com nenhum docente, porque a prova não faz qualquer sentido, é um
perfeito absurdo e apenas dá a medida do desnorte e da prepotência que reina pelos
lados da coligação de direita que nos coube em desdita. Ainda se fosse uma
medida para o futuro e com regras universais, como acontece com o ingresso em
carreiras como a medicina, a engenharia ou a advocacia, se admitiria. Assim,
não!
Desde logo, não
passa de um disparate obrigar a fazer a designada “prova de acesso à carreira”
docentes que já estão a trabalhar, embora como contratados, há 10, 15 ou 20
anos, em muitos casos com avaliações de “bom” ou “muito bom”. Por isso, é
"uma prova que não prova coisa nenhuma", como referem professores à
comunicação social, e com toda a razão.
E deveria
ser proibido ter professores naquelas condições tantos anos, quando o Estado
obriga os privados a admitir os funcionários nos quadros a partir de um
determinado número de anos de contratados. O Estado é um mau exemplo e um
explorador, com todas as letras. Como deveria ser interdito alguém vir
questionar a preparação ou as competências de um professor para a carreira,
depois de leccionar anos e anos… Estamos no alegre reino do delírio!...
Falamos de professores
que se formaram nas universidades creditadas pelo Estado para o efeito, com
quatro ou cinco anos de estudos; que fizeram os seus estágios curriculares como
mandam as regras; que se prepararam e cumpriram todas as etapas da sua formação
pedagógica para exercerem cabalmente a sua actividade numa sala de aulas.
Por isso, o
que está em causa, inequivocamente, é a falta de respeito do Governo pela
situação dos professores que já leccionam há anos e que se permite dispor a seu
bel-prazer da sua vida e destino. Chama-se a isso prepotência.
Como é
também falta de reconhecimento da qualidade científica e pedagógica das
universidades esta opção de Nuno Crato, que assim põe em causa de uma penada e
com a maior desvergonha e pedantaria a credibilidade do ensino superior deste
país, que ele quer asfixiar financeiramente.
Obviamente
que, por detrás do folclore verbal do Ministro da Educação, está o propósito de
afastar milhares de professores do sistema, com fins estatísticos. Para afirmar
à Europa que o desemprego no professorado é residual.
Estamos a
falar de uma sacanice de Nuno Crato aos professores, que pretende arrasar a
vida e o futuro de mais de quatro dezenas de milhares de professores, numa
prova de 120 minutos.
Outro
aspecto a considerar é o do esbulho que o governo faz aos professores. Uma
prova obrigatória e a pagar (20 euros) não passa de um infame saque aos
concorrentes, por parte de um governo sem escrúpulos, que o que pretende é eliminar
professores do sistema, obrigando-os a contribuir para o “ajustamento”, em mais
de 1 milhão de euros (contando a prova geral e a específica, a 15 euros por
cabeça, ao que se anuncia), sem a garantia de que venham a entrar na profissão.
E tantos deles nem sequer estão a trabalhar…
O mesmo Crato que inferniza a vida aos docentes e
desinveste claramente no ensino público, para o menorizar e descredibilizar, não
se coíbe de acenar com os melhores apoios ao ensino privado.
Porque é disso que estamos a falar. Esta gente
que nos governa nestes anos de chumbo quer acabar com tudo o que é público,
para entregar os sectores fundamentais da educação, da saúde, da economia, aos
privados.
Não estamos a falar de questões conjunturais,
ditadas pela crise. Estamos a falar de uma estratégia ideológica que está a ser
posta em prática pela direita ultraliberal para privatizar o melhor do país. Da
energia aos correios.
2. É nessa lógica distorcida e
algo satânica que se insere também a alienação dos Estaleiros Navais de Viana
do Castelo.
O secretário-geral da
CGTP, Arménio Carlos, exigiu no fim-de-semana um inquérito à subconcessão dos
Estaleiros ao grupo Martifer por suspeita de «favorecimento» ao sector privado
com este negócio.
Na verdade, há coisas
nebulosas no meio deste negócio, que deveriam exigir a intervenção e
investigação das autoridades, para aumentar a sua transparência e clareza.
Não
se entende o afã da privatização dos estaleiros e o despedimento de 609
trabalhadores. Como bem afirma o líder da CGTP, em 2012 o mesmo Governo «não
teve» três milhões de euros para adquirir matéria-prima para começar a
construir dois navios asfalteiros encomendados pela Venezuela, mas dispõe agora
de 30,1 milhões de euros para despedir seis centenas de trabalhadores.
Como
não se compreende que se passe a gestão daquela empresa para a Martifer, que
tem um passivo maior, da ordem dos 370 milhões de euros, quando o dos ENVC
rondará os 300 milhões de euros.
Sejam
os governantes pelo menos sérios a defender o interesse público, o que, neste
como em outros negócios, está muito longe de suceder.
E,
como se sabe, à mulher de César não lhe basta parecer!...