segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Meu querido mês de Agosto (1)


Emigrantes, graças a Deus!

Agosto nasceu hoje, dia primeiro do mês. Dá os primeiros vagidos, como quem acaba de vir ao mundo.
Titubeante, começou a sua existência com um “tempo” que já não se usa e que ninguém aprecia.
Chuva em Agosto põe qualquer cristão mal disposto.
Agosto é sinónimo de férias, de boa vida, de nada fazer, de não ter horários nem relógio a marcar o adormecer e o acordar.
Agosto é também sinónimo de emigrantes, esses heróis portugueses da contemporaneidade, que largam a sua terra à procura das melhores condições de vida e que merecem todas as estátuas e monumentos que se edifiquem em sua homenagem. Historicamente, foram das melhores coisas que Portugal forneceu ao mundo, fazendo nos últimos séculos parte da nossa identidade cultural.
O Jornal de Notícias editou hoje vinte páginas especiais dedicadas ao fenómeno da emigração e que merecem leitura atenta.
Aí se relembra que a diáspora nacional totaliza hoje 4 a 5 milhões de portugueses e luso-descendentes, muitos dos quais têm orgulho na sua portugalidade, ao contrário do que sucedia há algumas décadas. Hoje Portugal é um país moderno, respeitado no mundo, apesar de tudo o que a crise possa levar a supor, absolutamente diferenciado do que era há quarenta ou cinquenta anos atrás.
Os emigrantes hoje têm orgulho do seu país, sentem-se, mais que emigrantes, “cidadãos do mundo”, deste mundo global que aceita as diferenças, as origens territoriais e étnicas dos cidadãos. Hoje há filhos de emigrantes que são vereadores em municípios europeus e americanos, líderes associativos, empresários de sucesso que se impuseram pelo seu trabalho, pela sua determinação, pelo seu portuguesismo.
Há décadas, os portugueses abandonavam o seu país para escaparem à miséria, ao analfabetismo e à guerra colonial. Eram (sobretudo) homens com poucas letras, que mal sabiam ler e escrever, que se sujeitavam à lama e à escassez de higiene dos famosos bidonvilles (bairros de lata), e para os quais o que interessava era amealhar dinheiro para comprar uma courelas, fazer uma casa (estilo la maison), subir na consideração da comunidade aldeã e colocar os filhos a estudar, para que não reproduzissem a vida dos seus progenitores.
A paisagem minhota (e fafense) está repleta deste tipo de arquitectura de importação, que suscita o sarcasmo de muitos mas que seguramente será objecto de estudo sociológico nos anos futuros.
Regressavam em vistosos carros, para exibir um novos estatutos.
Hoje os novos emigrantes são jovens qualificados e cidadãos abatidos pela crise, que apostam numa diáspora temporária, para fugir à crise e refazer a vida. Parte-se com recursos, porque a emigração é vista como uma etapa, não uma vida. Há novos personagens na emigração, novos destinos, uma diferente visão e assunção de Portugal. As raízes já não constituem o apelo de outrora. Há hoje maior desprendimento, maior liberdade, oceânica libertação da terra, dos braços da mãe, dos sinos da aldeia, da feira da vila.
Que não dos ícones eternos, o regresso quase religioso e ritual em Agosto, o repovoamento dos lugares cada vez mais desertos, um pouco por todo o interior do país, as festas e romarias da aldeia, as idas à praia ou ao rio.
É claro que as coisas em Portugal não estão grande coisa. E os emigrantes não hesitam em optar por permanecer nos países de acolhimento, enquanto o país do coração não melhorar da sua precária saúde económica. Contudo, há um sentimento que os percorre durante longos onze meses: o regresso em cada Agosto ao seu país natal. Nem que seja para rever a alma familiar e o rosto de um país que os espera, os aprecia e valoriza.

PS: ao longo deste mês, vou tentar deixar para os leitores um diário (mais ou menos bissexto) de coisas e loisas, maiores ou mais reduzidas, com ou sem importância, para que a estação louca possa ser isso mesmo.

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